Solidão em tom menor
Cláudio Dias, Odilon Esteves, Marcelo Souza e Silva, Isabela Paes e Zé Walter Albinati em Urgente (Foto: Carol Thusek)
Há uma tensão entre a agonia contida no título – Urgente – desse novo trabalho da companhia Luna Lunera e a discrição imperante, perceptível no ritmo contemplativo e na construção de uma cena que permanece à meia luz (iluminação de Felipe Cosse e Juliano Coelho). Essa última característica remete a Breu, espetáculo concebido por Miwa Yanagizawa e Maria Silvia Siqueira Campos, do Areas Coletivo de Arte, responsáveis pela condução dessa montagem do grupo mineiro, atualmente em cartaz no Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB).
As mencionadas opções que atravessam a encenação parecem ter sido escolhidas com o intuito de potencializar a temática da solidão, de acentuar a sensação de exasperação, comum à galeria de personagens, todos residentes num prédio em ruínas composto por moradias estreitas, pequenos nichos onde cada um instala seu universo específico (a cenografia de Yumi Sakate e do Areas Coletivo de Arte enfileira no palco esses compartimentos claustrofóbicos). Há uma valorização do anonimato através do afastamento das histórias particulares de um caráter especial, por mais dolorosas que eventualmente sejam, perspectiva sintetizada no final, marcado por sobreposição de vozes que se confundem.
A dramaturgia, assinada em parceria pelos integrantes da Luna Lunera e do Areas, reúne fragmentos das vidas dos personagens – o homem endurecido que controla as leis de convivência entre os moradores, a mulher sem família e com problema de audição crescente que deseja engravidar, outros assombrados por antiga rivalidade posta à prova (em cena que fere a contenção do espetáculo) – entrelaçados, ao longo da sessão, com retalhos das vidas dos próprios atores. Os espectadores não têm acesso completo às histórias pessoais reveladas pelos atores (a confissão é sempre interrompida por uma rígida regra de tempo), assim como não são apresentados à totalidade das trajetórias dos personagens, captados numa dada fase de suas existências. Talvez a necessidade de estabelecer elos entre os personagens evidencie certa insegurança do grupo em deixar o público sem, ao menos, um esboço de trama e, nesse sentido, em assumir o vazio, a ausência, como foco da dramaturgia.
Cláudio Dias, Isabela Paes, Marcelo Souza e Silva, Odilon Esteves e Zé Walter Albinati imprimem credibilidade aos seus personagens e realçam a sintonia com o instante imediato ao trazerem à tona, ainda que brevemente, fatos determinantes de suas vidas, dissolvidos na colcha de relatos, formada por acontecimentos luminosos e tristes, desse espetáculo que, em suave tom menor, se impõe em cena.