Sentido de síntese em espetáculo volumoso
O Duelo, espetáculo da mundana companhia (Foto: Renato Mangolin)
A montagem de O Duelo, atualmente em cartaz no Espaço Tom Jobim, guarda pontos de ligação com O Idiota, espetáculo anterior da mundana companhia apresentado no mesmo Jardim Botânico, mas em formato itinerante, e a encenação de Pais e Filhos: o foco em autor russo e material literário (antes Dostoievski e Turgueniev, agora Tchekhov); a soma de contribuições criativas de artistas que passaram por diferentes grupos, porém afinados numa perspectiva teatral; e uma aparente disposição para realizar um trabalho volumoso, que abrace a obra original a partir de múltiplas possibilidades (ainda que sem a ambição de esgotá-la) e não por meio de um dado recorte.
Há talvez uma tensão entre essa última característica e a natureza sintética dessa montagem de O Duelo que, apesar de apostar na visualidade (a escultura inflável de Franklin Cassaro tem impacto inegável), imprime diante do público uma cena crua, distante do grandioso – uma cena formada por elementos básicos, a exemplo do plástico manipulado pelos atores para “produzir” o movimento do mar. Esta “limitação” da cenografia de Laura Vinci evidencia, na verdade, a riqueza do teatro, que reside mais no estímulo à imaginação do espectador por meio da sugestão do que da exibição de predicados tecnológicos.
A longa duração (cerca de 3h30) de O Duelo não se constitui como peso. Georgette Fadel assina uma encenação de fluxo contínuo, destituída, em medida considerável, de tempos mortos. A adaptação, a cargo de Vadim Nikitin e Aury Porto (com colaboração de Camila Pitanga), preserva valores como clareza e simplicidade na exposição da história. Nessa transposição cênica da novela de Tchekhov, questões centrais na obra do autor vêm à tona, especialmente no que diz respeito à verbalização de desejos de mudança que, contudo, acabam não se concretizando. As jornadas dos personagens são, muitas vezes, frustradas e os projetos de vida, abortados.
Os figurinos de Diogo Costa se destacam, mas sublinham, de modo algo maniqueísta, o embate entre Nadiejda Fiódorovna e Mária Bitiugova. A iluminação de Guilherme Bonfanti se vale de recursos variados (cabe realçar o uso de lampiões) para criar atmosfera expressiva. A direção musical de Otávio Ortega e Lucas Santtana surpreende pela mistura de referências. Os atores transitam com habilidade entre narração e vivência. A presença segura de Sergio Siviero sobressai, mas Carol Badra (dona de apreciável timing), Vanderlei Bernardino, Aury Porto e Pascoal da Conceição também possuem ótimos momentos. Seja como for, todos parecem integrados, coesos, engajados não só em suas passagens como na construção de uma cena próxima dos espectadores, distribuídos por arquibancadas que emolduram o palco.