Panorama da desolação
Cena de Krum, montagem de Marcio Abreu em cartaz no Oi Futuro/Flamengo (Foto: Nana Moraes)
Texto do israelense Hanoch Levin, Krum evoca a dramaturgia do russo Anton Tchekhov. Como Tchekhov, Levin reúne personagens estagnados, sem perspectivas, que eventualmente se casam ou viajam, experiências que, porém, não provocam um sopro de renovação. Talvez as figuras destacadas por Levin já não tenham muita expectativa em relação a um futuro melhor; estão cientes, em alguns casos, de seus fracassos, a exemplo do personagem-título, que volta desiludido para a sua cidade, onde trava reencontros ásperos com familiares e conhecidos. Entretanto, a desesperança não diz tudo sobre os personagens de Levin, desamparados diante da inevitabilidade da morte.
A montagem de Marcio Abreu, atualmente em cartaz no teatro do Oi Futuro/Flamengo, potencializa, sem reiterar, questões presentes nesse texto de Levin (traduzido por Giovana Soar e adaptado pelo próprio Abreu e por Nadja Naira) escrito na década de 1970. Há uma notável integração entre as criações que compõem a encenação. A trilha e os efeitos sonoros de Felipe Storino sugerem repetição e, ao mesmo tempo, suscitam tensão. O sentido de ameaça é valorizado na iluminação de Nadja Naira, que realça a estrutura fragmentada da peça, principalmente no começo do espetáculo, marcado por rápidas apresentações dos personagens, intercaladas por blackouts. Ao despontarem em cena, sozinhos ou em dupla, os personagens confirmam o panorama arruinado, mas a sensação que fica não é de redundância. Há um certo suspense referente à imagem que está por vir.
A iluminação, que se torna menos colorida à medida que o espetáculo avança, também transmite a desolação que atravessa os personagens. O cenário de Fernando Marés – de início, sintético, formado por piano e fileiras de cadeiras que emolduram a cena – gera espacialidade poluída a partir do instante em que os elementos são levados para o meio do palco de maneira propositadamente desajeitada. A direção de movimento de Marcia Rubin é bastante expressiva, em especial nos momentos em que limita as possibilidades de movimentação dos personagens ao confiná-los em espaço espremido, como se estivessem sendo oprimidos por paredes invisíveis. Os atores – Cris Larin, Danilo Grangheia, Edson Rocha, Grace Passô, Inez Viana, Ranieri Gonzalez, Renata Sorrah, Rodrigo Bolzan e Rodrigo Ferrarini – evidenciam um conjunto equilibrado, cabendo elogiar a habilidade de Sorrah nas transições de registro interpretativo e o domínio de Grangheia acerca do cético Krum.