Padrão de qualidade
Antonio Fagundes e Bruno Fagundes: duelo interpretativo (Foto: João Caldas)
O dramaturgo John Logan reúne, em Vermelho, algumas questões artísticas fundamentais a partir da relação entre o pintor Mark Rothko e seu jovem assistente Ken, personagem ficcional. Há um cuidado em entrelaçar o debate de ideias com as circunstâncias atravessadas por Rothko em determinado momento de sua trajetória e com a conexão desenvolvida com Ken. A oposição entre a noção da obra como exposição visceral, intransferível, do artista e a sua comercialização vem à tona através do incômodo de Rothko com a própria decisão de aceitar a proposta de ilustrar com seus quadros as paredes do luxuoso restaurante Four Seasons, em Nova York. Já o elo conflituoso entre as novas correntes artísticas e as anteriores é frisado pelo vínculo passional entre Rothko e Ken.
No entanto, os relevantes tópicos sobre arte levantados ao longo da peça dão a impressão de servirem, em certa medida, como verniz para abordar o relacionamento previsível entre um pintor irascível e seu assistente empenhado, também com aspiração à pintura. Logo no início, quando Mark Rothko anuncia que pretende travar com Ken um contato profissional destituído de projeções afetivas é possível prever que essa barreira imposta não será sustentada pelos personagens. De fato, Vermelho demonstra filiação a um formato dramatúrgico tradicional, tanto por seguir um modelo de construção dramática (as defesas emocionais dos personagens sucumbem diante de um convívio diário marcado por revelações) quanto por despontar como um atraente veículo interpretativo para atores, características confirmadas na direção de Jorge Takla.
Antonio Fagundes investe em assumido trabalho de composição (postura e voz) e imprime presença enérgica que estimula fluente contracena com Bruno Fagundes, que compensa a imaturidade (é perceptível a escassez de recursos flagrante na voz gritada em passagens de confronto direto) com uma visível dedicação. A encenação de Vermelho, em cartaz no teatro Sesc Ginástico, evidencia a preocupação com um padrão de qualidade. A cenografia de Jorge Takla reproduz em minúcias o ateliê de Rothko por meio de telas (pinturas de Marcos Sachs) e instrumentos de pintura dispostos detalhadamente sobre uma mesa. Os figurinos de Fábio Namatame são apropriados para o perfil de cada personagem. A iluminação de Ney Bonfante é mais do que um elemento da montagem ao incidir, de modo expressivo, sobre as telas, realçando a importância da luz na obra de Mark Rothko, capaz de influenciar na apreciação do espectador, afastando-o de uma condição passiva.
carmattos
21 de maio de 2013 @ 18:15
Ótima apreciação da peça, em texto com o padrão de qualidade Daniel Schenker.