O teatro como brincadeira levada a sério
Hamlet, montagem do Shakespeare’s Globe que faz sua segunda e última apresentação hoje na Cidade das Artes (Foto: Bronwen Sharp)
Dentro da programação do evento Encontro com Shakespeare, o Rio de Janeiro recebe brevemente – apenas duas apresentações, ontem e hoje, no Teatro de Câmara da Cidade das Artes – Hamlet, montagem do Shakespeare’s Globe, dirigida por Dominic Dromgoole e Bill Buckhurst, que vem viajando pelo mundo desde abril.
O caráter itinerante talvez justifique a simplicidade da cenografia, composta por baús e uma estrutura bastante reduzida que evoca, em alguma medida, o universo das companhias mambembes, historicamente presentes, e, claro, do próprio teatro, manifestação artística de fundamental importância dentro de Hamlet, considerando que é por meio da cena que o protagonista shakespeariano revela a verdade referente ao assassinato de seu pai pelo tio.
Mas o aspecto funcional não parece ter sido o único critério que norteou o Shakespeare’s Globe, tendo em vista que a encenação prima pelo despojamento e pela coloquialidade na disposição da trama e na relação com o público. Os atores contam a história em espaço cênico de pequeno porte, lembrando que não há muito sentido em tentar reproduzir todos os ambientes nos quais a ação transcorre. Os figurinos são bem mais sugestivos do que preocupados em localizar uma determinada época, às vezes trazendo à tona a informalidade das roupas retiradas de baús, do teatro como brincadeira, voltado ao estímulo à imaginação de quem faz e assiste.
A música possui papel preponderante ao longo do espetáculo. Os atores, de diferentes nacionalidades, tocam instrumentos, auxiliando não só na ambientação como tornando mais divertidas certas passagens – em especial, a da representação da peça de Hamlet. Em que pesem eventuais desníveis, os atores se mostram afinados com a proposta da montagem, sem traços de declamação, valendo destacar aqueles que, na noite do último domingo, interpretaram Hamlet, Horácio, Laertes e Gertrudes (que tem seu melhor momento no instante em que noticia a morte de Ofélia). Apesar do número limitado de sessões, o Shakespeare’s Globe fez bem-vinda visita com essa versão de Hamlet que integra painel formado pelas montagens brasileiras de Timon de Atenas e Ricardo III.