O refinamento da forma
A galeria de personagens de Maravilhoso, montagem em cartaz no Teatro Glaucio Gill (Foto: Alexandre Nunis)
Parece haver certo descompasso na dramaturgia de Maravilhoso. Diogo Liberano comprova crescente refinamento na escrita, qualidade que valoriza uma história de sabor algo déjà vu, um pouco atada ao lugar-comum: a de um desempregado que ascende economicamente ao ceder ao perverso jogo de manipulação de um bicheiro. A sensação de fragilidade aumenta diante da analogia entre o personagem que se vende, seduzido pela escalada na hierarquia, e o Fausto, de Goethe.
Na comparação com os textos anteriores de Liberano, Maravilhoso talvez seja aquele em que mais se identifique um enredo com evolução linear. O domínio que o autor revela em relação à linguagem, porém, se sobrepõe à previsibilidade da “trama”. O texto também ganha com a condução de Inez Viana, que volta a evidenciar méritos na direção – tanto no que se refere à expressiva utilização de elementos restritos para sugerir atmosferas (como a lâmpada, logo no início da sessão, trazendo à tona a precariedade do cotidiano do casal formado por Henrique e Wanda), quanto a um registro interpretativo distante do naturalismo, marcado pela movimentação coreografada dos atores.
O elenco demonstra conexão com a proposta lançada pela direção. Paulo Verlings apresenta atuação visceral sustentada por construção corporal e vocal. O ator imprime intensidade sincera sem bombear emoção. Márcio Machado faz do bicheiro um personagem surpreendente, não só pela entonação conferida ao texto como pela partitura física. Carolina Pismel alcança apreciável contundência em suas primeiras cenas, mas é prejudicada pelo esvaziamento da personagem ao longo da peça. Debora Lamm confirma a sua habilidade para a comédia. Orlando Caldeira tem presença bem menos precisa, possivelmente devido às circunstâncias ligadas à substituição do ator original (Felipe Abib).
A cena de Maravilhoso resulta de criações instigantes, a exemplo da cenografia de Luiz Henrique Sá, composta por uma espécie de andaime e por um forro gasto de quadriculado branco e vermelho, e dos figurinos de Flávio Souza, que, apesar de ocasionais indicações diretas (como a roupa de Henrique realçando sua ascensão), escapa a uma sinalização óbvia da condição sócio-econômica dos personagens. A iluminação de Paulo César Medeiros interage com a cenográfica (a julgar pelos desenhos geométricos em sintonia com o forro quadriculado) e destaca a passionalidade do vermelho.
Oscar Calixto
29 de agosto de 2013 @ 17:02
Gostei da Crítica, Dani… Poucos fazem como você! Respeitoso e Coerente…