O alcance do olhar
Priscilla Baer, Rafael Sieg, Isabel Cavalcanti, Renata Castro Barbosa, Robson Torinni e Daniela Porfirio em A Sala Laranja (Foto: Junior Marins)
Nem tudo o que ocorre na creche onde se passa a ação de A Sala Laranja: no Jardim de Infância, peça da argentina Victoria Hladilo, é visto pelo espectador. A reunião de pais não desponta como o único evento organizado na escola naquele momento, a julgar pelas constantes saídas da inspetora para supervisionar outras atividades e pelo modo como retorna – com o visual “transformado” a cada vez. A ambientação tipicamente realista da cenografia de Dina Salem Levy, que reproduz a atmosfera de uma sala destinada a crianças pequenas, não encerra, portanto, os acontecimentos descortinados no texto e nem se constitui como limitação à imaginação do espectador, estimulado a realizar projeções de espaços invisíveis.
Na sala onde os personagens se encontram, a reunião de pais se encaminha para a exposição da infantilidade dos adultos, que demonstram dificuldade para estabelecer acordos e respeitar diferenças. A “mensagem” de Hladilo é facilmente antecipada pelo público, mas Victor Garcia Peralta, diretor da montagem em cartaz no Teatro Candido Mendes, dribla a previsibilidade valorizando o humor da autora ao trazer à tona um certo jargão destacado pela inspetora e os típicos jogos pedagógicos aos quais os pais se submetem. Eventuais revelações sobre as vidas de cada um, aparentemente inseridas com o intuito de justificar atitudes – que, às vezes, mudam de maneira abrupta à medida que a reunião avança –, parecem algo artificiais, mas esse problema é minimizado graças ao frescor da cena.
Os atores, vestidos conforme os perfis de seus personagens (figurino de Luiza Fardin), interpretam figuras tipificadas (a controladora, a zen, a histérica, etc.), ultrapassando, porém, esquematismos devido ao timing ajustado e ao entrosamento no palco. Daniela Porfirio, Priscilla Baer, Rafael Sieg, Robson Torinni e, em especial, Isabel Cavalcanti e Renata Castro Barbosa defendem com habilidade os personagens, evidenciando plena adesão à situação proposta.
Se por um lado o texto de Hladilo soa ocasionalmente explícito em suas intenções (ainda que realçando questões importantes, como a intolerância crescente nos espaços de coletividade), por outro chama atenção para aquilo que está interditado ao olhar do espectador. Peralta dimensiona essa especificidade da peça e também investe numa comédia comunicativa sem enveredar por concessões e nivelamentos. Não é pouco.