No limite da correção
Heitor Martinez, George Sauma e Luana Piovani em Sonhos de um Sedutor, de Woody Allen (Foto: Matheus Cabral)
Comédia romântica dotada do encanto que costuma marcar a escrita de Woody Allen, Sonhos de um Sedutor tem como um das suas qualidades o fato de não esgotar suas ambições no apelo a uma identificação imediata entre texto e público, normalmente conquistada por meio de enumeração de características genéricas de homens e mulheres. Allen concebeu (e interpretou tanto no espetáculo que estreou na Broadway em 1969 quanto na adaptação para as telas dirigida por Herbert Ross em 1972) um personagem empático, Allan Felix, crítico de cinema recém-separado que procura, com a ajuda de um casal de amigos, Dick e Linda, um novo amor.
A encenação brasileira conduzida por Ernesto Piccolo, em cartaz no Teatro Ipanema, preserva o charme do original, ao manter a ação circunscrita a uma dada época (conforme evidenciado na cenografia de Clivia Cohen) e a localização em Nova York, com algo da atmosfera presente em obras de Neil Simon, apesar de certa indefinição na tradução (de Caulos) que, em determinado momento, menciona jogadores de futebol brasileiros. Piccolo encontra terreno conhecido nesse projeto, uma vez que, ao longo dos anos, tem apostado em textos coloquiais, mesmo que mais próximos do cotidiano dos espectadores do que esse. O diretor injeta fluência na cena, ainda que não ultrapasse o limite da correção de um entretenimento agradável.
Auxiliado pela direção de movimento de Deborah Colker, George Sauma faz do desajeitado Allan um personagem de inquestionável comunicabilidade com a plateia, mas não há como deixar de assinalar uma repetição de recursos (em especial, no que se refere a efeitos buscados através de inflexões vocais) já vistos em trabalhos recentes do ator, a julgar por suas atuações em espetáculos d’Aquela Cia. de Teatro e em montagens infanto-juvenis. Luana Piovani não envereda pela enganada trilha da graça artificial. A atriz, porém, não imprime muita vibração à personagem, principalmente nos minutos iniciais. Heitor Martinez surge como um Humphrey Bogart com os esperados exageros de composição e interpreta o workaholic Dick, figura de poucas variações. Em todo caso, a opção de levar o ator a se desdobrar entre os dois é discutível, diferentemente do natural acúmulo das personagens femininas por uma única atriz – Georgiana Góes, que dá vazão ao exercício de versatilidade na criação de vários tipos circunstanciais (a mulher e as diversas “candidatas” ao posto de namorada de Allan).