Na contramão da brasilidade convencional
Giovana Soar e Rodrigo Bolzan em projeto brasil (Foto: Marcelo Almeida)
projeto brasil, trabalho da Cia. Brasileira de Teatro que encerra temporada no próximo domingo na Sala Multiuso do Espaço Sesc, transcende o Brasil. O diretor (Marcio Abreu) e os atores (Giovana Soar, Nadja Naira e Rodrigo Bolzan), que criaram juntos a dramaturgia, trazem à tona posicionamentos acerca do mundo contemporâneo: destacam a solidão no meio virtual, a insuficiência do modelo tradicional de família, a luta dos homossexuais pelo reconhecimento dos seus direitos e o paradoxo entre o avanço tecnológico e a involução do ser humano. Ao mesmo tempo em que defende a importância da diferença, das especificidades de cada indivíduo, a montagem frisa a igualdade entre todos.
Há uma tentativa em escapar do lugar-comum, perceptível na mencionada dramaturgia que aborda o Brasil, mas não isoladamente, e por uma concepção estética concentrada no preto, na contramão das convencionais cores que sinalizam brasilidade. Esse objetivo, porém, é alcançado em parte, seja porque o grupo não apresenta propriamente um olhar novo em relação às (relevantes) questões referentes ao mundo de hoje, seja porque investe em algo esquemático jogo de contrastes (a primazia do preto sugerindo luto e os corpos em desequilíbrio em oposição a eventuais músicas de teor próximo à celebração). Essas restrições, contudo, não anulam a potência da encenação, que se estende ao espaço da plateia.
Apesar da constante verbalização, projeto brasil tem bons momentos no silêncio – a exemplo do discurso do ex-presidente do Uruguai, José Mujica, projetado sem a voz do ator, presente até então, da passagem em que os atores ficam estirados no chão sem falar e da mímica de Giovana Soar (talvez desnecessariamente acompanhada, a partir de determinado instante, pela música O Índio). Há um oportuno sentido de síntese na construção da encenação, a julgar pelos reduzidos elementos que constituem a impactante cenografia de Fernando Marés (uma plataforma redonda, giratória no meio, um painel escuro ao fundo, microfones, cadeira) em sintonia com a iluminação de Nadja Naira e Beto Bruel e os figurinos de Ticiana Passos. A trilha sonora de Felipe Storino (que também se coloca ocasionalmente em cena) tem influência decisiva sobre o resultado.
Ainda que o elenco esteja integrado, não há como deixar de observar que a atuação de Rodrigo Bolzan possui mais força que as de Giovana Soar e Nadja Naira. O ator sobressai especialmente no solo em que imprime entonações distintas à fala, que potencializam (sem reiterar) os climas emocionais do texto, e na cena do discurso de Mujica. projeto brasil se impõe como um dos trabalhos mais interessantes da temporada.