Exasperante maratona emocional
Roberta Alonso e Joaquim Lopes em Intimidades, em cartaz no Teatro Glaucio Gill (Foto: Dalton Valério)
Ao esmiuçar a mecânica conflituosa de um casal, Gustavo Machado procura se distanciar do mero levantamento de características generalizantes acerca de homens e mulheres. Não inscreve seu texto nessa acomodada vertente dramatúrgica bastante frequente no teatro atual que visa tão-somente a suscitar identificação imediata no público.
Apesar disso, ao dissecar a intimidade de um relacionamento (os impulsos não muito éticos, os desejos recônditos, as atitudes clandestinas), o autor não apresenta uma abordagem propriamente nova, reincidindo sobre um painel traçado em diversas obras. A peça alça voo mais alto quando o autor se debruça sobre o peso decorrente da passagem do tempo – o descompasso entre projeção e realização, a constatação daquilo que não há como recuperar.
Diretor que vem valorizando a dramaturgia estrangeira (clássica e, em especial, contemporânea) por meio de sua companhia, a Esplendor, e a brasileira em espetáculos avulsos, Bruce Gomlevsky revela sintonia com a proposta do autor ao evitar aderir ao realismo banal. Mas, por outro lado, a encenação evidencia uma ambição criativa – na cenografia, nos figurinos, na iluminação – acima das possibilidades expressivas da peça. Este desequilíbrio realça, ao invés de encobrir, as fragilidades dramatúrgicas.
A cenografia de Nello Marrese é composta por uma superfície inclinada – chamando atenção, talvez de modo literal, para a desestabilização do casal – e por paredes cobertas de tecido que parecem retalhos de vestido de noiva – símbolos que podem remeter a relacionamentos idealizados. Os figurinos de Rita Murtinho têm na calça gasta do personagem masculino o seu melhor elemento. A iluminação de Elisa Tandeta é uma criação instigante que apenas nos momentos em que insere tonalidades mais fortes reitera, em certa medida, os estados sublinhados no texto. A trilha de Marcelo Alonso Neves é um pouco mais interveniente que o necessário.
No que se refere aos atores, Joaquim Lopes reage à escuta e demonstra, em outros instantes, já saber o que escutará, tendo em vista a estrutura de funcionamento viciada, repetitiva, do vínculo amoroso. Roberta Alonso se mostra mais armada, cristalizada, e imprime uma carga emocional algo postiça ao longo de exasperante maratona conjugal. A atriz também é prejudicada por um desenho de personagem excessivamente irascível.