Distâncias suavizadas
Pedro Henrique Müller, Lívia Paiva e Clarisse Zarvos em Domínio do Escuro (Foto: Renato Mangolin)
À primeira vista, Domínio do Escuro parte do contraste – no caso, entre os depoimentos de idosos sobre as dificuldades em assumir a homossexualidade em décadas anteriores, marcadas por contundente discriminação, e jovens atores (Clarisse Zarvos, Lívia Paiva e Pedro Henrique Müller) que trazem à tona essas vivências nesse início de século XXI.
A diretora estrutura o espetáculo em planos diversos, realçando o dos depoimentos, transmitidos ao público através da voz em off dos entrevistados em cena tomada por blackout. Os depoimentos revelam ao espectador dolorosas lembranças de exílio forçado decorrente de agressiva rejeição familiar, a necessidade de exercer a homossexualidade em esfera clandestina – realidade raramente suavizada por uma manifestação de aceitação – e corajosas disposições para romper formato de casamento tradicional em prol do arrebatamento da paixão.
Aproximando-se da vertente documental, que tem se destacado cada vez mais no panorama teatral, Domínio do Escuro não trata propriamente de fatos que ocorreram nas vidas dos atores (como o projeto Ficção, da Cia. Hiato, a cargo de Leonardo Moreira, ou de BR-Trans, encenação de Jezebel De Carli, na qual Silvero Pereira entrelaça sua jornada com relatos colhidos Brasil afora). Mas Juliana Pamplona, autora e diretora da montagem atualmente em cartaz na Sede das Cias., procura encurtar as distâncias ao fazer com que os atores se apropriem das experiências evocadas pelos entrevistados, com que portem as palavras dos outros como se fossem suas.
A diretora acerta sempre que opta pela fala simples e direta na presentificação de histórias do passado. Algumas cenas, porém, resultam esgarçadas. Na condução do elenco, não envereda pela ênfase (boa decisão), ainda que Clarisse Zarvos e Lívia Paiva sejam mais irregulares que Pedro Henrique Müller, mais seguro no registro em tom menor que atravessa a encenação. O cenário de Elsa Romero, particularmente sintético, é composto por cinco pequenos bancos. Os figurinos, também de Romero, fundem o masculino e o feminino por meio da inclusão de rendas em roupas convencionais. A expressiva iluminação de Lara Cunha recorta, em dados momentos, e integra, em outros, os personagens, inserindo cores mais vibrantes de maneira comedida. A trilha sonora de Jonas Sá imprime sabor de época.