Construção parcialmente encoberta
Diogo Liberano em O Narrador, em cartaz no Espaço Sesc (Foto: Philippe Baptiste)
Apesar da articulação teórica (referente ao ensaio O Narrador – Considerações sobre a Obra de Nikolai Leskov) e das diversas colaborações artísticas durante o processo, essa nova iniciativa do grupo Teatro Inominável desponta como projeto intimista de Diogo Liberano, centrado em experiências emergenciais de sua vida, em especial no que diz respeito ao confronto com a morte de pessoas próximas.
Em cartaz na Sala Multiuso do Espaço Sesc, às quartas-feiras, O Narrador pertence a uma vertente bastante frequente nesse momento (no teatro e no cinema), voltada para a utilização de vivência do artista como matéria-prima de trabalho. O artista passa a se colocar de maneira mais frontal, direta, na obra, assumindo presença na primeira pessoa do singular (registro que aproxima de certa corrente da performance). Não significa exatamente que o ator surja em cena sem personagem, até porque talvez isso não seja possível quando se está diante de uma plateia ou de uma câmera. Contudo, o personagem não é mais uma instância que protege tanto o ator, no sentido de ocultar suas reais motivações, e sim uma espécie de biombo transparente – mais revelador, mas sem perder de vista o fato de que a exposição visa a uma construção artística.
Diogo Liberano sublinha procedimentos que, a princípio, gerariam distanciamento na conexão com o público: lê o texto, usa o microfone e se vale, como o título indica, do lugar da narração. O resultado obtido, porém, é o inverso. Ao invés de esfriarem sua atuação, tais opções realçam a dificuldade de Liberano em expressar perdas determinantes. Essa impressão é potencializada ainda pela busca do ator por uma voz marcadamente pessoal. Mas, mesmo sem ferir a integridade da proposta, parece haver algo de calculado em O Narrador, uma condução pensada para suscitar uma dada reverberação emocional no espectador, sensação que vem à tona, por exemplo, por meio do emprego da trilha sonora.