Atmosfera nostálgica
Lu Camy em A Moça da Cidade: em busca do homem ideal (Foto: Gui Maia)
A Moça da Cidade é um espetáculo despretensioso construído em torno da evocação da atmosfera das novelas radiofônicas. O autor Anderson Bosh reconstitui os tradicionais recursos dos programas de rádio de décadas passadas que, diante da ausência de imagens, eram empregados com o intuito de estimular a imaginação do ouvinte. Radioatores interpretam uma história cômica que se transforma em melodrama ao final – a de uma moça interiorana, Ambrosina, determinada a viver na cidade grande. Logo que se depara com a nova paisagem, ela se percebe destoante. Mas não esmorece em sua busca pelo homem ideal, insatisfeita com o que a realidade acena.
Em cartaz na Sala Mutiuso do Espaço Sesc, a montagem de Rodrigo Pandolfo valoriza, de início, o registro dos radioatores. A partir da chegada da protagonista ao Rio de Janeiro, os atores se afastam um pouco do microfone e passam a se dedicar mais às composições dos personagens. As peculiaridades das radionovelas, como as sonoplastias, permanecem ao fundo da cena. Talvez o diretor pudesse ter potencializado mais esse plano, algo ocultado pela distância e pela barreira de um biombo transparente.
A cenografia de Miguel Pinto Guimarães é formada por biombos e painéis utilizados para projeções de imagens antigas do Rio de Janeiro (vídeos de Felipe Bond) e de cenas do filme Uma Rua chamada Pecado, versão cinematográfica de Elia Kazan para a peça Um Bonde chamado Desejo, de Tennessee Williams, uma boa escolha, ainda que citada com certo excesso. O efeito obtido na cena da luta entre Ambrosina e Leitinho, seu pretendente, soa dispensável. De qualquer modo, o sabor nostálgico propiciado pelas projeções, também decorrente da interação com a iluminação de Tomás Ribas, é agradável.
Os figurinos de Bruno Perlatto são propositadamente exagerados para Ambrosina, frisando sua inadequação ao contexto no qual desembarca. No elenco, Lu Camy tem mais oportunidades e faz de Ambrosina uma figura empática e divertida. Dida Camero e Gabriel Delfino Marques se desdobram em mais de um papel, destacando-se, no caso dela, como a dona da pensão e, no dele, como o pai de Ambrosina, graças a bons trabalhos de voz.
A montagem de A Moça da Cidade não ultrapassa a esfera da simpatia, realçada por referências – além do filme de Kazan, a menção à cadela Laika, lançada ao espaço – que trazem à tona a década de 1950. Em se tratando, porém, da primeira direção de Rodrigo Pandolfo, o resultado evidencia méritos consideráveis.