A problematização da padronização
Não Nem Nada, montagem da Cia. Empório Sortido, em cartaz no Teatro Poeirinha (Foto: Débora 70)
Não Nem Nada, novo trabalho da Cia. Empório Sortido em cartaz no Teatro Poeirinha, entrelaça retalhos de vidas preestabelecidas. No fragmentado texto de Vinicius Calderoni (que acumula a função de diretor), cada um parece seguir uma espécie de modelo institucionalizado, composto por etapas tradicionais. É como se os personagens pincelados na dramaturgia não se apropriassem de suas existências, no sentido de fazerem suas próprias escolhas, como se não fossem portadores de identidades. Assim, o texto aponta para trilha diversa da de Música para Cortar os Pulsos, montagem realizada a partir de peça de Rafael Gomes (que assinava a encenação e participa de Não Nem Nada como codiretor), e de Gotas D’Água sobre Pedras Escaldantes, de Rainer Werner Fassbinder (espetáculo dirigido por Gomes), ambos centrados em figuras mais personalizadas – no primeiro caso, voltadas para relatos de emoções juvenis e no segundo, para a escravidão amorosa.
De certo modo, os elementos que integram Não Nem Nada dialogam com o texto ao não incorrerem na padronização. Evidenciam proximidades, mas não semelhanças, tendo em vista a preservação de especificidades. Os atores (Geraldo Rodrigues, Mayara Constantino, Renata Gaspar e Victor Mendes) se multiplicam em vários personagens e trabalham visando a um somatório, a uma força conjunta. O grupo se impõe em detrimento de solos interpretativos, apesar de haver determinadas características particulares nas atuações. A iluminação de Wagner Antônio e Robson Lima individualiza as presenças dos atores, unificando-as, porém, durante a maior parte do tempo. Os figurinos de Valentina Soares insinuam, mas escapam à equivalência, por meio de detalhes que distinguem uma roupa da outra. A cenografia, dos já citados Valentina e Wagner, que consiste numa plataforma com aberturas para alçapões, também realça diferenças (as distintas elevações atrás).
Mais do que simplesmente radiografar temas da contemporaneidade, Não Nem Nada lança possibilidades de leitura que valorizam o resultado, distanciando-o do lugar-comum.