A marca da competência
Laila Garin como Elis: construção minuciosa (Foto: Felipe Panfili)
Elis segue à risca determinadas vertentes detectadas em alguns musicais biográficos: uma dramaturgia tradicional, que percorre a trajetória do artista de acordo com a linha cronológica; uma atuação marcante, que busca mais incorporar o espírito do que copiar a personagem real; e um modelo grandioso de produção, apesar de nem sempre ostentado.
O texto de Nelson Motta e Patricia Andrade traz à tona a jornada de Elis Regina sem arroubos de inventividade. Os autores cobrem o início de seu percurso, ainda em Porto Alegre ao lado dos pais, a vinda para o Rio de Janeiro, os vínculos promissores travados no Beco das Garrafas, o elo passional com Ronaldo Bôscoli e o incomodamente estável com César Camargo Mariano. O contato com figuras como Jair Rodrigues, Henfil e Paulo Francis é frisado. Elis desponta como uma cantora dotada de intensidade nervosa. Inscrita em formato convencional, a dramaturgia é ocasionalmente previsível, a exemplo da passagem sobre a crise no casamento com César Camargo Mariano.
A encenação em cartaz no teatro Oi Casa Grande não exibe seu caráter espetacular. O diretor Dennis Carvalho equilibra a vibração do musical com cenas mais intimistas. Extrai ótimo rendimento do conjunto (as coreografias de Alonso Barros são pontos fortes da montagem), com exceção talvez de uma evocação um pouco artificial da juventude hippie. E dá boa possibilidade interpretativa para a atriz Laira Garin – especialmente no segundo ato –, que tem seu principal momento na parte da entrevista, quando evidencia sua minuciosa construção de Elis.
Em relação aos demais atores, Felipe Camargo e Claudio Lins contam com maiores oportunidades como os maridos de Elis, enquanto que o resto do elenco sobressai em instantes isolados. Ícaro Silva comprova o timing e a maleabilidade corporal, perceptíveis em trabalhos anteriores (o musical Rock in Rio), como Jair Rodrigues. Danilo Timm se mostra à vontade como Lennie Dale. Peter Boos confere autoridade a Henfil. Já Caíke Luna e Maíra Charken evocam Paulo Francis e Marília Gabriela evidenciando a opção por composições que visam a uma comicidade de resultado imediato junto ao público.
A despojada cenografia (direção de arte) de Marcos Flaksman propõe a recriação de ambientes com objetos simples (cadeiras, mesas) por meio de superfícies deslizantes e deixa espaço para os atores evoluírem em cena. O telão é utilizado de modo apenas ilustrativo. Os figurinos de Marília Carneiro reproduzem com bastante precisão as tendências das décadas nas quais viveu Elis. A iluminação de Maneco Quinderé derrama cor sobre o palco no segundo ato. Também cabe destacar a direção musical e os arranjos de Delia Fischer. Mesmo sem enveredar por uma abordagem mais autoral, Elis, a Musical se impõe como espetáculo bem orquestrado que concilia domínio técnico e contagiante emoção.
Luiz fernando Gallego
12 de dezembro de 2013 @ 12:49
Avaliação exata neste texto, inclusive apontando o exagero da “cena hippie” da qual Elis jamais fez parte. Do mesmo modo o papel de “reveladora” de compositores aparece de modo exagerado – mas musical biográfico é para idealizar mesmo e não para apontar defeitos na personalidade da pessoa já falecida. O espetáculo tem padrão internacional de musicais dentro do esquemão. Já que é bem feito, tanto melhor.
Marcos
12 de dezembro de 2013 @ 13:29
A Elis é irrepresentável, querido Daniel! Deve estar com ódio onde estiver.
Abração