Danilo Maia e Gabriel Flores em Latitudes dos Cavalos (Foto: Clarissa Ribeiro)
Autor de Latitudes dos Cavalos, peça em cartaz até essa quarta-feira no Teatro Glaucio Gill, Gabriel Flores se mostra mais interessado na estruturação da cena do que propriamente no conteúdo do texto. Por meio de seus personagens, procura prestar uma homenagem ao teatro e, em particular, ao ator.
Há, desde o começo, uma valorização do desenho, da forma, de um externo que não se traduz como embalagem vazia, através de uma sucessão de movimentos físicos frenéticos, abruptos e breves, realizados em ritmo bastante acelerado. Apesar do elo entre o enredo, centrado na relação entre dois desconhecidos, e o dia a dia, essa proposta de linguagem afasta a montagem da representação do cotidiano.
Além disso, o modo como a situação-base é exposta não tende a gerar no público uma identificação imediata com uma realidade familiar. Existem elementos pouco críveis, uma falha talvez intencional de Gabriel Flores como autor com o intuito de produzir um nível de estranhamento no espectador, que fica impossibilitado de estabelecer uma apreciação tão-somente passiva com o que acontece no palco. É improvável que dois homens se conheçam num cinema pornô e iniciem uma conexão calcada na troca de informações acerca de suas experiências conjugais sem que o apelo sexual do ambiente norteie essa interação.
Seja como for, o objetivo principal do autor não é falar sobre as agruras emocionais de ambos – nas tentativas de retomar o vínculo amoroso ou de encerrá-lo –, mas destacar os papéis que exercem num jogo teatral, algo evidenciado quando um deles “encarna” a esposa do outro e, mais adiante, quando se firma uma dinâmica ator/diretor entre eles. A construção do ato teatral se impõe no texto – e no espetáculo – a partir do momento em que passam a ensaiar, evocando as mulheres mencionadas, e, especificamente, no instante em que um dos atores comenta sobre uma tonalidade da iluminação da cena.
O tributo ao teatro se manifesta ainda na concepção de uma cena quase que inteiramente destituída de recursos cenográficos (apenas quatro cadeiras remetendo ao espaço do cinema). Essa ausência de adereços sinaliza um desejo de apostar no texto e nos atores. Danilo Maia imprime notável colorido à interpretação, tanto no que se refere à variedade de intenções ao longo do texto quanto à integração entre o manejo da palavra e o desenho corporal (cabe elogiar a supervisão de movimento a cargo de Soraya Bastos) em atuação que não cai na armadilha do preciosismo estéril. Gabriel Flores trabalha em voltagem mais discreta, cumprindo, com disciplinado empenho, os desafios lançados em sua dramaturgia.
Em Latitudes dos Cavalos, Gabriel Flores demonstra um prazer pela arquitetura do texto e pelo jogo entre os personagens. Não escapa, contudo, do risco de esgotamento de sua proposta. Os personagens funcionam como representantes de funções artísticas no processo teatral, mas também poderiam existir de maneira mais plena como indivíduos autônomos, portadores de subjetividades. Esse preenchimento não inviabilizaria o apego à estrutura nos planos da dramaturgia e da encenação. A percepção panorâmica do espetáculo é dificultada pelo acúmulo de tarefas assumido por Gabriel Flores (autor, diretor e, agora, ator, substituindo Willean Reis). Restrições à parte, o resultado se mantém instigante, qualidade realçada numa insinuada articulação entre vida e teatro, instâncias fincadas no presente absoluto, sem chance de recuperação do passado.
Latitudes dos Cavalos – Texto e direção de Gabriel Flores. Com Danilo Maia e Gabriel Flores. Teatro Glaucio Gill (Praça Cardeal Arcoverde, s/n). Quarta, às 20h. Ingressos: R$ 40,00 e R$ 20,00 (meia-entrada).
Blackyva (sentada), Jessica Barbosa, Muato, Izak Dahora, Hugo Germano e Diego Ávila (com a câmera): interface entre teatro e audiovisual (Foto: Ligia Jardim)
Viviane da Soledade
Saudade é uma palavra difundida pelo mundo como única no vocabulário brasileiro para exprimir o sentimento de falta, ausência, perda e distância daqueles ou daquilo que amamos. Chega de Saudade é uma canção de Vinícius de Moraes e Tom Jobim lançada na década de 1950 na voz de Elizeth Cardoso, uma das maiores intérpretes do Brasil. Mas a música se torna referência da Bossa Nova somente na voz de João Gilberto, ícone do movimento musical que forjou o imaginário cultural sobre certa noção de brasilidade projetada para o mundo. Uma versão possível para a escolha do nome que cunhou o estilo musical tem a ver com a citação à música São Coisas Nossas, de Noel Rosa, de 1931, que relaciona o samba e “outras bossas” à noção de pertencimento brasileiro. A palavra “bossa” era uma gíria carioca para nomear um jeito, maneira ou modo original e específico de ser brasileiro. A Bossa Nova foi criada como um movimento cultural de superação desse jeito brasileiro popular e acabou por fundamentar uma crítica ao contexto popular ao qual o samba estava inserido como “coisa de preto”, “marginal” e “favelado”.
O espetáculo Chega de Saudade!, d’Aquela Companhia, estreou em São Paulo em 2022 e agora faz uma nova temporada no Teatro Prudential, no Rio de Janeiro, cidade de origem do grupo e da Bossa Nova. Esse é um espetáculo-manifesto que tem como principal premissa dar um basta na apropriação cultural afro-diaspórica para constituir um certo tipo de brasilidade branca à qual insistem em nos definir enquanto brasileiros. Na dramaturgia de Pedro Kosovski, com colaboração e interlocução de Rodrigo de Arruda, a Bossa Nova é o principal mote para estruturar essa crítica social. A dramaturgia dá subsídios fundamentais para a direção de Marco André Nunes apresentar inúmeros procedimentos cênicos que materializem um gradativo basta à melancolia dos tempos remotos de crença na democracia racial que foram tão prejudiciais à luta antirracista. Muitos processos culturais em nome da democracia racial, inclusive, foram ainda mais racistas. Algo digno de atenção em tempos em que o fascismo toma grandiosas proporções no mundo e no Brasil com o recente governo de Jair Bolsonaro. Para estabelecerem uma conexão desse tempo passado com a atual ideologia fascista os personagens fazem menção aos filhos do ex-presidente e se apresentam como o segundo comando da Bossa Nova talvez, até mesmo numa ironia ao álbum musical João Gilberto – O Mito, de 1988, como possível analogia à forma como eleitores de Jair Bolsonaro o chamam. Tudo isso para fazer o espectador entender a conexão possível entre arte e política, além da necessidade de desconfiar dos “mitos”.
Após a abolição da escravatura, a elite branca brasileira criou um elaborado mecanismo racista que ora evidenciava a distinção de raça e ora apagava essa mesma distinção para dar conta do seu projeto civilizatório branco, previsto para o país. Diante de um Brasil que se pretendeu purista, a operação de apagamento histórico e assimilação cultural se tornou uma estratégia para o convencimento da pretensa democracia racial. A época da criação da Bossa Nova se propagava o mito da democracia racial para edificar o projeto modernista de país desenvolvido. Durante anos, grupos de artistas, como o Teatro Experimental do Negro, assumiram a causa prioritária de desconstrução dessa premissa que só enfraquecia as lutas raciais por políticas públicas de reparação histórica. Se “a pretendida democracia racial realmente é uma ficção ideológica”[1] era preciso fabular outras ideologias a favor do movimento negro. Para isso, a questão da visibilidade para os negros e negras é de extrema importância, pois quem não é visto não existe. Saber-se pessoa negra é carregar consigo a responsabilidade de dar a ver as desigualdades sociais para garantir a existência. Há um compromisso ético no campo da visibilidade de não reprodução de determinadas violências para o rompimento do fluxo de exclusão. Para mim o espetáculo Chega de Saudade! é fundamentalmente sobre isso.
A crítica à Bossa Nova estruturada cenicamente neste trabalho, é, a meu ver, principalmente sobre o processo de embranquecimento ao qual fomos submetidos e à apropriação cultural negra como um procedimento para a efetivação desse projeto civilizatório eurocentrado. Nas cenas de Chega de Saudade!, as críticas aos mecanismos racistas consolidados no Brasil são suprimidas nesse movimento musical como mote de inúmeros procedimentos colonizadores nas Artes e na sociedade de maneira geral. A proposta d’Aquela Companhia é radicalizada na composição inédita para o grupo de um elenco exclusivamente negro convidado para contar uma história essencialmente branca do ponto de vista negro. Por meio dos corpos negros dos artistas em cena, que representam personagem historicamente brancos, se evidencia a violenta operação de apagamento dos negros na trajetória da Bossa Nova.
Jessica Barbosa, Blackyva, Muato, Hugo Germano e Izak Dahora (na tela) no espetáculo d’Aquela Companhia (Foto: Ligia Jardim)
O espetáculo se faz crítico ao racismo não exclusivamente por sua dramaturgia, mas pela proposta cênica que vai se estruturando a partir das corporeidades negras e da evocação de suas culturas. A partir disso se apresenta uma fabulação de tudo o que estava por trás do movimento cultural Bossa Nova. A potencialidade da cena está justamente na oscilação entre significado e significante estabelecida pela dramaturgia no jogo com a corporeidade dos artistas. O poder imaginativo que o trabalho tem de confrontar a ficção com a realidade estabelece o seu processo de reparação histórica. Desde 2005 que Aquela Companhia tem perseguido um trabalho relevante de conjugar a dramaturgia como crítica social fabulativa e com potencialidade cênica. Nesse espetáculo é mais evidente a contribuição coletiva para a composição da dramaturgia, uma vez que ambos os componentes da companhia são brancos e as críticas raciais parecem ser construídas a partir das contribuições dos artistas que estão em cena. Por se tratar de um trabalho atravessado pela noção de memória coletiva, fabulação e imaginário social que tem como maior mobilizador a crítica social, os artistas reunidos nos apresentam uma revisão do que o Brasil produziu como “coisa nossa” para a Bossa Nova.
A música como um fio condutor dramatúrgico é um traço marcante de Aquela Companhia. No entanto, Chega de Saudade! é o primeiro espetáculo do grupo que vai abordar a música como tema central da sua dramaturgia. Porém, esse espetáculo não é um musical, apesar de abordar a Bossa Nova, ter uma banda em cena e lançar mão da música como operação dramatúrgica. A primeira cena apresentada ao público é uma música com sonoridades africanas cantada pelo artista Muato anunciando e enunciando a “bossa” negra. Então, o público já é imediatamente inserido no contexto musical negro a partir de referências artísticas negras fundamentais para a compreensão histórica desse país – uma compreensão mais ampla, que considere a influência africana, como os seus batuques e tambores, para o samba, o rap e o funk.
A atriz Polly Marinho se apresenta como “Garota de Copacabana”, duplo deslocamento semântico, uma vez que a garota símbolo da Bossa Nova é de Ipanema e loira. Ela será também a narradora, comentarista, locutora, diretora do filme sobre a Bossa Nova que será gravado naquele instante – que nada mais é do que o espetáculo de teatro a ser apresentado. Polly é a voz de fora da cena estando dentro de cena, é a nota de rodapé da dramaturgia de Pedro Kosovski e Rodrigo de Arruda, é a sintetização de todos os pontos de vista negros desse coletivo para a confrontação da História hegemônica. É por meio dessa personagem-narradora que a crítica social se enuncia da maneira mais direta. Para que o público não crie falsas expectativas, a personagem já informa o posicionamento estético e político do espetáculo em que Tom Jobim e Vinícius de Moraes, criadores da Bossa Nova, serão coadjuvantes, quando na verdade eles sequer aparecem em cena e são reduzidos a ligeiras citações textuais quase como vingança.
A maior parte do espetáculo se passa em Copacabana, na sala do apartamento de Nara Leão, musa da Bossa Nova, que é representada pela projeção de uma janela típica da Zona Sul da cidade. Essa sala é o reduto da Bossa Nova onde se desenrolam as cenas que simbolizam os moldes de vida da burguesia, criadora do estilo musical em voga. Tais códigos sociais para além do cenário são efetivados também pelos figurinos de Fernanda Garcia. Entende-se a Bossa Nova como um movimento anti-popular, em contrapartida à noção de povo e sua arte criada nas ruas pela classe trabalhadora. A Bossa Nova surge no âmbito doméstico, na sala da classe média alta, da Zona Sul do Rio de Janeiro, por pessoas que gozavam da sua branquitude ao mesmo tempo que anunciavam admiração aos negros dos quais queriam se distinguir mais e mais. Segundo a crítica apresentada pelo grupo, trata-se de um movimento cultural que teve a pretensão de criar algo novo a partir dos referenciais populares, mas para superá-los. Buscava-se algo original, “autêntico”, erudito para se diferenciar como produção artística de maior qualidade, usando como base a produção cultural negra sem nenhuma devida citação. Diziam-se a origem do samba como se não houvesse precedente. Essa noção de origem é o cerne do racismo estrutural existente no Brasil, pois nunca é atribuída aos povos colonizados e seus descendentes.
Nessa sala estão Nara Leão, Roberto Menescal, Carlos Lyra, Ronaldo Bôscoli, Sylvia Telles, uma das maiores intérpretes da Bossa Nova, sobretudo das músicas criadas por Tom Jobim e Vinícius de Moraes para Orfeu da Conceição, espetáculo montado pelo Teatro Experimental do Negro em 1954 com direção de Abdias do Nascimento. Esse espetáculo foi emblemático por ter sido a segunda vez que o grupo formado por um elenco de atores e atrizes negros ocupava os palcos do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, o mais famoso da época. Agora, 69 anos depois do TEN, o espetáculo Chega de Saudade! coloca em cena atores e atrizes negros interpretando personagens historicamente brancos, algo impensável para a época. Na sala-símbolo da elite branca, os personagens cantam a letra “Você é um predador terrível” que vai tomando contornos de um funk apoteótico. Os personagens Nara Leão, interpretado por Blackyva, e Roberto Menescal, interpretado por Hugo Germano, debocham das sonoridades da Bossa Nova como algo pretensamente original.
Hugo Germano, Jessica Barbosa, Blackyva e Muato: o movimento da Bossa Nova em abordagem contrária ao saudosismo (Foto: Ligia Jardim)
O cenário de Ciro Shu e Marco André Nunes projeta ao fundo uma janela que sobrepõe o banheiro e o camarim que só aparecem parcialmente pela projeção da gravação ao vivo das cenas. Além da janela central, projetada, há outra janela como outra perspectiva e angulação diferente do que se vê de um apartamento da classe média alta carioca. A sala-símbolo da branquitude é o lugar escolhido para que o público veja a Bossa Nova – tal como se conhece no imaginário social coletivo, ser gradativamente tensionada, a começar pela presença exclusiva de corpos negros em cena, mas também pelas ácidas críticas ao modo de vida burguês, ao mesmo tempo em que se apresenta uma outra Bossa Nova possível. Assim como o jogo cenográfico é estabelecido por sobreposições, a cena vai apresentando o que está por trás da Bossa Nova tal como se conhece. Dar-se a ver, ouvir e sentir o que poderia ser uma Bossa Nova sem a ocultação dos remelexos e rebolados que têm o quadril como eixo fundamental do corpo e da sensualidade tal como no samba e em toda a contribuição artística afrodiaspórica, que foram apropriadas pelos movimentos culturais das elites brancas desse país sem nenhum crédito.
A projeção triplica as imagens da cena criando um embaçamento da visão do espectador, quase como quem quisesse sugerir à Bossa Nova uma certa alienação sensível da população sobre a representatividade da produção artística afro-diaspórica. Se, em alguma medida, a Bossa Nova dialoga com o samba brasileiro e o jazz norte-americano, ambos movimentos musicais criados por pessoas negras, há um conflito que desemboca na cena em que o cantor americano Louis Armstrong é citado. Então, a sala de um enorme apartamento carioca com “14 metros” de extensão, situada no “berço” da Bossa Nova, torna-se um grande ringue de disputa cultural, mas também de reparação histórica.
Se a Bossa Nova se torna famosa mundialmente pelo seu ritmo, mas também pela capacidade imagética que tem sobre o Brasil para além dele, destacando constantemente o amor, Chega de Saudade! vai abordar a dimensão do amor negro que a Bossa Nova ocultou, segundo a narradora. O espetáculo volta para os espectadores uma importante indagação: de qual Brasil a Bossa Nova estava falando? Quem estava sendo devidamente amado no Brasil na década de 1950 e 1960 em que a população negra se encontrava em profundo abandono governamental, recém-libertos de um regime escravocrata, condicionados ao desemprego, às moradias precarizadas, num país que se pretendia branco e que, por meio de cotas de incentivo aos imigrantes europeus para morar no país se industrializou, se desenvolveu e se embranqueceu. Enquanto a população negra escravizada e seus descendentes foram violentamente negligenciados e abandonados, mas ainda assim sobreviveram e construíram boa parte desse país.
Ao falar de amor branco, matéria-prima da Bossa Nova, por meio do romance de Sylvia Telles, interpretada por Jessica Barbosa, e João Gilberto, interpretado por Izak Dahora, ou da tensão sexual existente entre Nara Leão, interpretada por Blackyva, e Ronaldo Bôscoli, interpretado por Felipe Oládélè, o espetáculo faz o contraponto com a noção de amor negro. O amor para os negros é uma grande pauta de discussão para os movimentos sociais negros desde a Bossa Nova, que foram se alastrando para as futuras gerações – a exemplo da campanha “Reaja à violência racial: beije a sua preta em praça pública”, de 1991, promovida pelo jornal do Movimento Negro Unificado, uma das mais importantes de nossa história, que se tornou um símbolo nacionalmente conhecido pelos grupos antirracistas, conscientizando sobre a importância da afetividade aos negros contra uma cultura racista. Essa campanha nos fez perguntar sobre o que é o afeto negro, tendo em vista que à época, homens e mulheres negras não podiam manifestar o seu afeto publicamente, sob o risco, inclusive, de acarretarem grandes repressões. Na mesma medida, a batucada, o samba e a capoeira foram elementos de censura pública e policial. De que amor a Bossa Nova estava falando quando mais da metade da população não tinha direito à humanidade, logo ao amor?
Polly Marinho: voz de fora/dentro da cena (Foto: Ligia Jardim)
O espetáculo Chega de Saudade! apresenta o avesso da Bossa Nova, o que ela oculta ao longo da História, o que não foi mostrado, mas deturpado, ou mesmo escondido. Os personagens dizem: “Tom (Jobim) rouba tudo”. Enquanto o ator Izak Dahora faz um comentário-denúncia sobre a gravidade da apropriação cultural efetivada pelo seu personagem João Gilberto que admite: “A Bossa Nova na verdade é samba, e só isso”. Está aí o cerne da questão colocada ao longo do espetáculo: o quanto a produção cultural reproduziu o modo colonial hegemônico que tem profundas raízes na nossa sociedade ainda hoje. Na boca do personagem João Gilberto, enunciado por um corpo negro, como se fosse “homem branco”, o ator faz necessariamente de toda a sua fala uma crítica à branquitude. Aquele que se pretendeu “autêntico”, fazendo samba e utilizando a síncope – contratempo na música que se prolonga até o tempo forte, herança africana. A direção musical de Felipe Storino corrobora com a narrativa, a exemplo da música Bim Bom, de João Gilberto, cantada pelos artistas até evidenciar toda a crítica do espetáculo num inteligente jogo com a letra. Ao dizerem: “É só isso meu baião, e não tem mais nada não” de diferentes formas, com tempos distintos e pausas estratégicas, fazem aparecer a crítica à apropriação de culturas negras, mas ridicularizam o minimalista da Bossa Nova, até acelerarem a cadência da música para surgir um grande samba festivo. Procedimento semelhante realizado com Desafinado, também de João Gilberto, em que o ator Muato manipula a palavra “privilegiado” da letra da música, evidenciado uma discussão sobre privilégios tão atual no campo das disputas sociais. Com isso, é dado outro significado à letra de João Gilberto como operação estética quase documental do discurso do espetáculo. Então, a Bossa Nova não pode ter nada de “natural” se em nada representa a maioria da população brasileira da época. Na cena do sarau em que a personagem Nara Leão acusa a Bossa Nova de farsa, devido a desconexão que há entre esse movimento e a vida cotidiana das pessoas, a personagem se nega a cantar a música Lobo Bobo, de Carlos Lyra. A personagem não canta Bossa Nova, mas canta a realidade da favela como uma convocação à plateia para refletir a perpetuação da Bossa Nova ainda hoje. Na tentativa de exposição da mentalidade racista existente no movimento musical Bossa Nova, a narradora critica a letra de Samba da Benção, de Vinícius de Moraes, e seu modo como compreender a mulher, além da propagação da noção de democracia racial agregada à ideia de miscigenação cordial e gloriosa.
Ao final do espetáculo, surge a homenagem à Alaíde Costa, “única negra da Bossa Nova que ficou para trás”, assim como Johnny Alf. A reverência à cantora é uma das cenas mais bonitas do espetáculo, numa apologia ao amor negro entre dois personagens evidentemente apaixonados quando cantam o samba-canção Me deixa em paz, de1952, dos compositores Monsueto e Airton Amorim. Ouvir a letra “Se você não me queria não deveria me procurar. Não deveria me iludir, nem deixar eu me apaixonar. (…) Você arruinou a minha vida. Me deixa em paz” depois de assistir a quase todo o espetáculo gera inevitável a correlação entre a cena e a demanda urgente de amor preto e à necessidade de pessoas que se entendam como não negras nesse país se engajarem na luta antirracista. Essa homenagem é movida pelo amor e admiração aos negros. Essa é uma resposta ao racismo que perpetua ainda hoje e corrobora com a morte da população negra, pois é sobre isso que se trata. Para mim, o espetáculo é uma operação teatral de desilusão da população, justamente em um “espaço” criado para a ficção – que é o teatro. Mas a fabulação imaginativa é um direito das pessoas negras ainda não garantido e muito usufruído pelas pessoas brancas para forjar a inferioridade de uns em detrimento de outros. A ficção sobre dados históricos é uma possibilidade de fabular mundos possíveis para a população negra, ao mesmo tempo em que permite a retificação do passado. A história contata de uma outra maneira, sobretudo de pontos de vistas antirracistas, é a possibilidade de extinguimos a monocultura que persiste nesse país. Nesse espetáculo, a crítica radical a um movimento cultural ainda muito querido, que forjou muitos imaginários, que se constituiu como orgulho nacional, requer coragem. Mas não deve ser compreendido, a meu ver, como o risco de cancelamento, e sim como uma oportunidade de nos compreendermos enquanto sociedade e não permitir mais que determinadas operações racistas em nome da arte aconteçam novamente. Espero que a plateia saia do teatro ávida por assistir a outros espetáculos em que os corpos negros estejam na centralidade das suas questões possibilitando assim a sua aparição como sujeitos da história.
[1] Frase do antropólogo Thales Coutinho referenciado por Abdias Nascimento, fundador do TEN, para respaldar uma das suas maiores militâncias durante todo o seu ativismo que era a desarticulação da crença na igualdade racial. COUTINHO apud NASCIMENTO, 2016. p. 53.
Chega de Saudade! – Texto de Pedro Kosovski. Direção de Marco André Nunes. Com Blackyva, Felipe Oládélè, Hugo Germano, Izak Dahora, Jessica Barbosa, Luiza Loroza, Muato e Polly Marinho. Teatro Prudential (R. do Russel, 804). De sexta a domingo, às 20h. Ingressos: R$ 60,00 e R$ 30,00 (meia-entrada).
Maurício Lima em Arqueologias do Futuro (Foto: Dayana Jacqueline)
“Você me vê?”, pergunta Maurício Lima ao público de Arqueologias do Futuro, disposto próximo à cena nas apresentações realizadas durante o Festival de Curitiba. De início, o espectador enxerga flashes do corpo nu do ator, que, no breu, manipula a luz em dinâmica acende/apaga. Ele fala sobre a interioridade, priorizando uma descrição prática (e enumeração dos órgãos localizados dentro do corpo humano) em detrimento de uma abordagem existencial/filosófica (a alma).
Apesar do ator não enveredar por uma perspectiva de interioridade física vinculada à fé numa essência espiritual, há, nessa introdução, certa abertura para a abstração. A imagem é pouco vista pelo espectador, guiado pela voz do ator numa proposta de relação sensorial. A partir de dado momento, tudo fica mais concreto. Termina o lusco/fusco da luz e ao público é permitido enxergar totalmente o ator, que contextualiza a indagação inicial do trabalho: Maurício Lima é um dos muitos corpos negros invisibilizados na sociedade – ou, ao contrário, destacados, mas como marginais, como alvos em violentas ações de exclusão. Corpos que dificilmente se tornam exceção em meio a uma estrutura de funcionamento aniquiladora.
A superfície onde imagens de comunidade urbana são exibidas traz recortes que sugerem os traços sinalizados na rua para demarcar o contorno de pessoas mortas – geralmente, assassinadas – estendidas na rua. Não se trata, portanto, de uma tela plana, cristalina. As imagens nela estampadas surgem “falhadas” e escapam, em alguma medida, ao olhar do espectador. Nesse sentido, Arqueologias do Futuro é um solo que intencionalmente continua não se revelando de modo integral diante do público.
Diferentemente do começo, Maurício Lima, que assina dramaturgia e direção com Fabiano de Freitas, não recorre tanto à palavra. Ela permanece presente, mas o que impera é o corpo que dança pela geografia da comunidade, transitando pelo espaço cênico por meio de movimentos sinuosos, próprios de quem domina os códigos necessários à sobrevivência num campo minado. A comunidade, por outro lado, é a região do corpo liberto, talvez utópico, que se expressa sem amarras e extravasa de maneira catártica.
Ao final, o ator retorna ao corpo invisível, mas de forma lúdica, através da figura do homem-bola que, com o rosto escondido por um conjunto de grandes bolas coloridas, caminha pelas ruas. É o que faz Maurício Lima nesse trabalho, que, nascido durante a pandemia e mostrado remotamente, rompe as delimitações do teatro (também enquanto manifestação artística com características específicas) e se expande para o mundo de fora.
Janaína Leite e Amália Fontes Leite em Stabat Mater (Foto: Susan Sena)
Uma das tendências mais evidentes da cena contemporânea é a utilização de experiências particulares – com frequência, de natureza trágica – como matéria-prima para projetos artísticos. Com cada vez mais assiduidade, atores e atrizes vêm externando suas vivências íntimas diante de espectadores desconhecidos. Apesar de elaborados cenicamente, os conteúdos pessoais são expostos de maneira clara e não fica dúvida de que pertencem àquele que está trazendo-os à tona.
Num extremo dessa vertente, a Cia. Hiato apresentou um conjunto de cenas intimistas, reunidas sob o nome de Ficção, nas quais o público ocasionalmente se deparava, no palco, com o parente a quem o intérprete se referia em seu depoimento. É também o que se dá em Stabat Mater, trabalho que integra a programação da Mostra Lucia Camargo no Festival de Curitiba, marcado pela interação entre a atriz Janaína Leite e a própria mãe, Amália Fontes Leite.
De acordo com Janaína, um dos principais nortes desse trabalho foi suprir uma lacuna – a conexão com sua mãe – constatada após a realização de uma encenação centrada em seu pai (Conversas com meu Pai). À questionada ausência da mãe no espetáculo anterior, Janaína responde por meio dessa montagem, cujo título, Stabat Mater, significa “a mãe estava lá”.
Responsável pela dramaturgia, a atriz/performer entrelaça seu percurso emocional com a história da Virgem Maria. O cruzamento entre o sagrado e o profano é realçado a partir do instante em que Janaína revela um acontecimento traumático, ocorrido há mais de 20 anos: um estupro que sofreu no caminho para a escola num dia em que, excepcionalmente, não estava acompanhada da mãe.
Ao conceber esse trabalho ao lado de Amália, Janaína fez uma proposta inusitada e, no mínimo, bastante desconfortável: convidou a mãe a dirigi-la numa cena de sexo explícita com um ator pornô. Será que Stabat Mater é uma vingança da filha em relação à mãe, que não pode protegê-la de uma enorme violência? O contato sexual, ensaiado sob a condução de Amália, é projetado, na tela, ao final do espetáculo.
No palco, Janaína desconstrói a representação e, ao mesmo tempo, adere ao mascaramento (literal, em alguns momentos). Coloca-se, frente à plateia, “sem personagem”, no formato de palestra informal, explanando sobre a gênese do trabalho, contextualizando-o dentro de sua investigação artística. Essa atuação transparente se manifesta no tom coloquial e na voz destituída do artificialismo da empostação. Mas cabe assinalar que, na noite de estreia da encenação no Festival de Curitiba, parte considerável do texto dito pela atriz não era escutado pelo público. Tal fato aparentemente não se devia a uma escolha artística, decorrente de um eventual confronto do espectador com a inevitabilidade da perda, com a falta de acesso total ao que é falado e mostrado, e sim a uma limitação técnica.
Em contrapartida a esse registro “invisível”, Janaína se posiciona como representação de filha, assim como Amália simboliza a mãe e Lucas Asseituno, o profissional do sexo (os três vestem camisas que estampam essas funções). Encontram-se, nesse sentido, interpretando papéis – talvez porque isto invariavelmente aconteça quando se está no palco diante de uma plateia –, por mais que Amália e Janaína sejam mãe e filha na esfera da realidade. No que diz respeito ao terceiro elemento, a instância ficcional é mais explícita. Os atores pornôs surgem na tela por meio da exibição de trechos das entrevistas fornecidas à Janaína. Eles têm identidade, ao passo que o personagem feito por Lucas no teatro não possui voz, nem rosto.
Atriz que fez parte do Grupo XIX e hoje desenvolve pesquisa no campo do teatro documental, Janaína Leite demonstra plena adesão à linha autobiográfica flagrante no panorama da cena atual, destacando, em Stabat Mater, uma conjugação entre planos (supostamente?) opostos, como realidade/representação e maternidade/pornografia.
Cena de Hamlet, espetáculo que abriu a atual edição do Festival de Curitiba (Foto: Teatro La Plaza)
Em determinado momento da versão da companhia peruana Teatro La Plaza para Hamlet, perguntam ao ator Jaime Cruz se está em cena como Jaime ou como Hamlet e ele diz: como “Jaimlet”. A resposta sintetiza, de alguma forma, a proposta artística do espetáculo, escolhido para abrir o 31º Festival de Teatro de Curitiba, no palco do Guairão. Sob a condução da diretora Chela De Ferrari, responsável pela dramaturgia escorada na célebre peça de William Shakespeare, os atores, portadores de Síndrome de Down, se afastam de interpretações consagradas, tanto no que se refere ao texto original quanto ao modo de representar os personagens. Realizam uma apropriação, na qual, em certo grau, aproximam as questões que perpassam a obra da realidade que os atravessa.
O deslocamento no mundo é uma possível conexão entre o personagem Hamlet e os atores dessa montagem, ainda que não se deva perder de vista as diferenças. O descompasso de Hamlet com a maioria que o rodeia decorre de uma reverberação interna dos acontecimentos relacionados ao assassinato de seu pai. Já a distância imposta, com frequência. às pessoas com Síndrome de Down, habitualmente postas à margem da sociedade, surge do preconceito social diante de uma dada configuração física – portanto, de uma percepção restrita à aparência corporal, ao externo. Enquanto o protagonista de Shakespeare, a partir do instante em que é confrontado com a verdade revelada pelo fantasma do pai, acentua a falta de pertencimento ao contexto que o cerca, o elenco do Teatro La Plaza dá vazão a um espetáculo que reivindica uma justa integração.
Num plano geral, a montagem demonstra uma perspectiva crítica em relação a padrões estéticos pré-estabelecidos. Problematiza a limitação que normalmente confina os artistas, muitas vezes avaliados de acordo com o phisique du role. Em esfera mais localizada, esse trabalho nasceu da especificidade corporal comum aos atores, que se colocam como bloco e também individualmente. Todos têm Síndrome de Down e todos podem ser Hamlet. Não por acaso, o Hamlet que desponta no palco não é um só. O protagonista é partilhado pelo elenco, ao invés de feito por um único intérprete. Os atores, porém, não aparecem massificados, como conjunto indistinto, até porque uma mesma condição física é experenciada de maneiras diversas.
Fundado nas vivências concretas e subjetivas dos artistas, esse trabalho frisa sua autenticidade e evidencia uma natureza intransferível, na medida em que não há como outros atores simplesmente reproduzirem as marcações. Como constata Álvaro Toledo, que faz parte do elenco, após tentar imitar a movimentação física de Laurence Olivier no Hamlet de 1948, “para mim, copiar não é atuar”. Chela De Derrari não investe em caminhos mais seguros na abordagem da peça e estimula o elenco a se aproximar do texto numa jornada, nesse sentido, mais verdadeira. A verdade se constitui, inclusive, como a luta do personagem-título, que se vale do teatro como instrumento de denúncia. Afinal, é por meio de uma representação que Hamlet expõe aos demais as circunstâncias do assassinato de seu pai.
Nesse Hamlet contemporâneo e editado, que narra e encena a peça de Shakespeare, os atores (além dos citados Álvaro e Jaime, Cristina León Barandiarán, Diana Gutierrez, Lucas Demarchi, Manuel García, Octavio Bezerra e Ximena Rodríguez) usam roupas do dia a dia, sem qualquer ambição de fidelidade histórica. O olhar lançado sobre o texto é dessacralizado e o espetáculo busca a potência do inacabado, do esboço, do rascunho. Há constantes menções ao processo criativo, à fase de levantamento do trabalho. Não significa que a montagem não possua estrutura cênica, comprovada na própria presença dos atores e na interação com o multimídia que rende bons momentos, a exemplo da solução encontrada para a morte de Ofélia.
Nessa encenação de Hamlet, apresentada anteriormente no festival Mirada e no Sesc Consolação, o corpo é um elemento fundamental. Cabe destacar que o espetáculo começa com a imagem de um nascimento e termina com os atores verbalizando, apesar de brevemente, questões primordiais, em especial sobre a morte.
Ao longo dos anos, muitas companhias deixaram as cidades onde nasceram e migraram para o eixo Rio-São Paulo na busca por melhores condições de sobrevivência e na esperança de alcançar maior repercussão com seus espetáculos. Essa mudança geográfica, talvez norteada por uma dose de ilusão, vem gerando evidente esvaziamento cultural das cidades – e Londrina, polo de teatro e dança, é apenas um entre tantos exemplos. Mas não cabe depreciar os coletivos que decidem por essa transição, até porque envolve riscos consideráveis. E há companhias que não se afastaram de seus locais de origem. O Grupo Galpão, de Belo Horizonte, é possivelmente o mais conhecido em meio a diversos outros que não aderiram à vinda para o Sudeste.
Com menos frequência que o desejável, algumas dessas companhias vêm desembarcando no Rio de Janeiro e permitindo ao espectador entrar em contato com suas propostas de linguagem, enriquecendo, desse modo, a temporada. Do Nordeste, particularmente, o público carioca teve a oportunidade de assistir, nas últimas décadas, a encenações de grupos como o Piollin, o Ser Tão Teatro (ambos de João Pessoa), o Magiluth (do Recife), o Bagaceira (de Fortaleza), o Olodum e a Cia. Baiana de Patifaria (os dois de Salvador). Agora, a plateia do Rio confere Ubu – O que é Bom tem que Continuar!, espetáculo concebido a partir da parceria entre três grupos de Natal: o renomado Clowns de Shakespeare, que celebra 30 anos de trajetória, o Facetas e o Asavessa.
Responsável pela dramaturgia, Fernando Yamamoto apresenta um desdobramento – com acento notadamente tropical (realçado pelo visual kitsch) – da peça do simbolista Alfred Jarry. Aproxima do espectador brasileiro os personagens ambientados, no texto original, na Polônia, referência, em todo caso, distante de qualquer contorno realista. Seja como for, Yamamoto não investe numa aclimatação direta ao contexto nacional. Não envereda por esse caminho fácil, que renderia citações tão numerosas quanto previsíveis a figuras da vida política, mas estimula o espectador a traçar articulações com o noticiário do país. As eventuais menções despontam como brincadeiras em relação a nomes contrastantes, de autoridades acadêmicas e personalidades midiáticas da contemporaneidade. Mas Yamamoto, que também assina a direção da montagem, não evita que a dramaturgia resulte algo reiterativa ao sublinhar constantemente os malefícios do casal Ubu em sua sede desmedida pelo poder, tal qual o casal Macbeth – só que em variação cômica. É como se o texto “andasse” mais em círculos do que em linha reta.
Em instantes isolados, o espetáculo estabelece conexão com a plateia pela via da teatralidade assumida e do tom de permanente deboche e escracho, ingredientes sintonizados com o espírito da obra de Jarry. Os momentos de graça simples e popular, que requisitam interação do público (sem expor individualmente os espectadores), são os mais eficientes, a julgar por aquele em que a plateia é convocada a fazer movimentos de louvação à campanha de Pai Ubu, registradas para exibição como programa eleitoreiro. Vale destacar mais uma cena em que o grupo atinge o pretendido efeito de humor: quando Ubu, consagrado como Rei, condena, de maneira sucessiva e arbitrária, os integrantes do povo, que verbalizam suas reivindicações.
Em outras passagens, a encenação persegue a comicidade sem realizá-la plenamente, limitação que deve ser creditada, em parte, à irregularidade do elenco, que aposta na vertente da representação expansiva e caricata sem, porém, demonstrar amplo domínio desse código. Ainda assim, Rodrigo Bico e Paula Queiroz, encarregados dos personagens centrais, revelam afinidade em cena. É preciso dizer que na noite do último sábado, por causa das condições meteorológicas, o espetáculo não pode ser apresentado ao ar livre, de acordo com o planejado, e se viu obrigado a trocar o Pátio das Tamarineiras por um local fechado dentro do Sesc Tijuca. A alteração não favoreceu a montagem, transferida para espaço menos caloroso. A nova configuração, contudo, não inviabilizou a comunicação com a plateia, disposta em roda e contagiada, em certo grau, pela musicalidade (dramaturgia musical a cargo de Marco França e Ernani Maletta, com músicas do primeiro e letras de Yamamoto).
Ubu – O que é Bom tem que Continuar!, mesmo sem concretizar inteiramente a sua ambição como comédia, valoriza uma teatralidade composta por elementos básicos, como tecidos estampados, característica que tende a suscitar simpatia. E proporciona ao espectador carioca se deparar com uma expressiva amostra da cena de Natal.
Ubu – O que é Bom tem que Continuar! – Direção e dramaturgia de Fernando Yamamoto. Com Caju Dantas, Deborah Custódio, Diogo Spinelli, Paula Queiroz e Rodrigo Bico. Pátio das Tamarineiras do Sesc Tijuca. (R. Barão de Mesquita, 539). De quinta a sábado às 19h, domingo às 18h. Ingressos: R$ 30,00, R$ 15,00 (meia-entrada), R$ 7,50 (credencial plena).
A personagem de A Aforista, texto de Marcos Damaceno inspirado em obra do escritor austríaco Thomas Bernhard, surge, em cena, com um vestido cuja cauda se estende pelo palco até a parede, onde está presa. Essa proposta, concebida a partir de uma integração entre figurino (de Karen Brusttolin) e cenário (de Damaceno), determina uma circunstância física contrastante para a atriz Rosana Stavis, que fica com os movimentos trancados da cintura para baixo e livres da cintura para cima. Uma configuração que remete à imagem da Winnie, de Dias Felizes, que tem parte do corpo enterrada e a outra, liberta.
Mas enquanto na peça do irlandês Samuel Beckett a personagem vai sendo cada vez mais sugada pela terra numa impotência física divergente da sua perspectiva solar, na de Damaceno a condição corporal se mantém inalterada e a personagem, diferentemente da luminosidade de Winnie, destila, com humor ácido, farpas referentes a artistas egocêntricos.
Esse foco temático é, sem dúvida, um elo com o outro trabalho realizado por Stavis/Damaceno a partir de uma articulação com Bernhard: Árvores Abatidas ou para Luis Melo. Não por acaso, os espetáculos são componentes de uma trilogia. A personagem-narradora de A Aforista relata ao público sobre dois homens, pianistas como ela. Um deles cometeu suicídio por inveja do sucesso do colega ou, mais exatamente, diante da constatação do descompasso entre a aclamação que projetou para si e a real extensão de seu talento.
Em Árvores Abatidas, Stavis interpretava uma mulher que não estava no centro da ação, tanto por não ser a protagonista da história que contava quanto por sua localização geográfica (permanecia no hall de uma casa, sem jamais entrar na festa ambientada no cômodo ao lado, conforme os sons ouvidos pelo público). Em A Aforista, a personagem tem papel igualmente coadjuvante no conflito que expõe.
Apesar de ter sido próxima dos pianistas e testemunhado o desenrolar dos acontecimentos, ela frisa um certo afastamento ao afirmar que aquele embate não lhe diz respeito, na medida em que sua motivação artística não é a competitividade e sim a urgência em marcar oposição à própria família. A dramaturgia joga luz sobre essa figura periférica, destacada na iluminação de Beto Bruel.
O descolamento da personagem em relação aos fatos que esmiuça diante da plateia se manifesta ainda em sua posição de narradora. O ato de narrar pressupõe um distanciamento, mas também uma atualização da vivência por meio da presentificação do passado. Em A Aforista, o espectador se depara com uma descrição destituída de visceralidade e dotada de discreta dose de compaixão feita por uma mulher acerca de situações das quais participou em parte.
Uma mulher entre dois pianistas – justamente a disposição cênica do espetáculo de Damaceno, em cartaz no Teatro I do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), que traz Stavis atuando entre os pianistas Sergio Justen e Rodrigo Henrique, que se encontram nas laterais do espaço num espelhamento relativizado por distinções nos figurinos.
Rosana Stavis interpreta essa mulher que debocha de um mundo artístico atravessado pela vaidade – um mundo com o qual está, em algum grau, comprometida. A atriz demonstra pleno controle do descontrole corporal dessa personagem, a julgar pelo domínio do desafiante contraponto entre imobilidade e movimentação frenética. A segurança com a palavra não é menor. Stavis imprime modulações diversas ao texto que, ao invés de resultarem num preciosismo, num maneirismo estéril, potencializam um estado de desestabilização física e mental. Evidencia louvável fluência em rápidas transições emocionais, mais uma prova da precisão com que maneja suas ferramentas de atuação.
Uma eventual sensação de repetição suscitada pela evocação do espetáculo anterior – afinal, são os mesmos diretor/dramaturgo e atriz envolvidos com a apropriação do universo do mesmo autor – não atrapalha a apreciação de A Aforista, uma encenação que sinaliza uma coerente continuidade de trabalho na parceria entre Marcos Damaceno e uma irrepreensível Rosana Stavis.
A Aforista – Texto e direção de Marcos Damaceno a partir da obra de Thomas Bernhard. Com Rosana Stavis. Teatro I do Centro Cultural Banco do Brasil (R. Primeiro de Março, 66). De qua. a sáb., às 19h30, e dom. às 18h. Ingressos: R$ 30,00 e R$ 15,00 (meia-entrada).
O investimento num teatro voltado para uma ampla faixa de espectadores é representado, entre outros espetáculos da atual temporada do Rio de Janeiro, por Baixa Terapia, peça do dramaturgo argentino Matias Del Federico que ganha o palco em montagem dirigida por Marco Antônio Pâmio, em cartaz até o próximo domingo no Teatro Clara Nunes. Sem perder de vista a importância da experimentação de linguagem no panorama contemporâneo, um espetáculo filiado à tradição do teatro de mercado supre uma lacuna fundamental na cena de hoje, levando em conta o crescente afastamento de uma expressiva camada de público nas últimas décadas.
A escolha de um texto pertencente à comédia é natural, uma vez que esse gênero costuma suscitar uma relação mais direta e imediata com a plateia. Os personagens de Del Federico irrompem no palco como casais que se reúnem para uma terapia de grupo e se veem diante de uma circunstância, no mínimo, inusitada: a terapeuta propositadamente se ausenta e deixa instruções que devem ser seguidas pelos pacientes. O mote é promissor e não há como explicar mais sem anunciar reviravoltas que o autor reserva ao espectador.
No entanto, mesmo sem ignorar a bem-vinda longevidade da carreira do espetáculo em São Paulo e o comparecimento do público no Rio, Baixa Terapia sinaliza problemas em sua concepção dramatúrgica. Verborrágico, o texto não alcança a pretendida voltagem de humor. E a virada final da história, apesar de surpreendente, evidencia uma desvalorização da própria comédia.
A revelação que encerra a peça traz à tona um assunto grave e, nesse instante, Del Federico se distancia do cômico, como se o julgasse inapropriado para abordar a questão. Ao requisitar o drama, numa brusca mudança de tom, para chamar atenção para uma temática bastante séria, o autor parece considerar a comédia como campo limitado, ineficaz diante de objetivos como estimular uma reflexão ou gerar um potencial de choque – objetivos supostamente maiores, mais nobres, do que entreter a plateia. Baixa Terapia termina como uma comédia que, de alguma maneira, renega o gênero, como uma comédia envergonhada. Mas também há no desfecho uma homenagem à representação como caminho para elucidar a verdade, o que remete ao ofício teatral e, em particular, ao trabalho do ator, que constantemente se expõe através das identidades fictícias assumidas no palco.
No que diz respeito à encenação, Marco Antônio Pâmio orquestra a movimentação dos atores – dispostos, de acordo com a situação, num único espaço fechado –, mas não evita uma sensação de estatismo, decorrente do texto, que carece de vitalidade na vagarosa evolução dos personagens pelos estágios da terapia em grupo. Contudo, a opção por uma peça como Baixa Terapia é louvável em se tratando da trajetória de Antonio Fagundes. Ator consagrado na televisão, Fagundes, porém, nunca se separou do teatro. Permaneceu ao longo do tempo participando de montagens de espetáculos e, mais do que isso, esteve à frente, durante boa parte da década de 1980, de uma companhia – a Companhia Estável de Repertório, projeto movido por sua associação com o produtor Lenine Tavares. No caso desse texto em específico, Fagundes se dedica a um material que não oferece oportunidades como protagonista. Ele divide igualitariamente a cena com os outros cinco atores. Não se preocupou com a priorização de uma peça que favorecesse seu brilho individual, o que demonstra generosidade artística e desconexão com o vedetismo do primeiro ator.
Fagundes, portanto, surge integrado ao coletivo, em sintonia com o registro naturalista, praticado por quase todo o elenco: Alexandra Martins, Fábio Espósito, Guilherme Magon e Mara Carvalho. O rendimento é variável, com destaque para Carvalho. A exceção é Ilana Kaplan, cuja interpretação contrasta com esse código. A atriz aproveita o seu domínio da linguagem clownesca para delinear uma personagem oprimida, à beira do transbordamento, do extravasamento. É uma atuação estilizada, expandida, que intencionalmente destoa das demais, com bons momentos de graça física e certa concessão à afetação.
Ainda que as restrições referentes ao terreno da dramaturgia reverberem na encenação, Baixa Terapia cumpre a missão de reaproximar ou preservar a presença de uma quantidade significativa de público no teatro.
Baixa Terapia – Texto de Matías Del Federico. Direção de Marco Antônio Pâmio. Com Antonio Fagundes, Ilana Kaplan, Fábio Espósito, Mara Carvalho, Guilherme Magon e Alexandra Martins, Teatro Clara Nunes (R. Marquês de São Vicente, 52 – Shopping da Gávea). Sex., às 21h, sáb., às 20h e dom., às 18h. Ingressos: R$ 140,00 e R$ 70,00 (meia-entrada). Peça + visita aos bastidores: R$ 240,00 e R$ 170,00 (meia-entrada).
Apesar da distância no tempo e no espaço, Cerca Viva, texto de Rafael Souza-Ribeiro em cartaz no Teatro Firjan/Sesi, remete, em alguma medida, às dramaturgias do norueguês Henrik Ibsen e do russo Anton Tchekhov – em particular, suas peças Casa de Bonecas e As Três Irmãs.
Como o original de Ibsen – escrito nas últimas décadas do século XIX –, o texto de Rafael – produção recente, mas com história ambientada nos anos 1950 – destaca o processo de libertação de uma personagem feminina protegida numa espécie de redoma, em especial no que diz respeito à estrutura estável do casamento. Tanto a Nora, de Ibsen, quanto a Lúcia, de Rafael, cumprem, pelo menos até dado momento, as funções destinadas a uma esposa nos moldes tradicionais, ainda que a primeira tome iniciativas ocultas e que a segunda manifeste, na esfera conjugal, a insatisfação com um cotidiano quase imposto.
Os pontos de ligação entre os textos não excluem, logicamente, as diferenças. A questão da maternidade é um elemento em comum, que, porém, ganha desdobramentos distintos em cada peça. No polêmico final de Casa de Bonecas, Nora rompe não só com o casamento, mas com o convívio com os filhos, como necessidade de proclamar a sua independência e encontrar um lugar no mundo. Em Cerca Viva, a perspectiva da gravidez interfere na postura de Lúcia. Outro tópico de aproximação: o contexto econômico dos dois casais (Nora-Helmer/Lúcia-Luiz). Contudo, a situação financeira de Nora é mais sólida que a de Lúcia, levada a se mudar para uma cidade do interior, mesmo que com determinada projeção (Volta Redonda), devido às oportunidades profissionais do marido.
Cerca Viva também lembra As Três Irmãs, peça sobre personagens que não conseguem concretizar os próprios planos, como o ansiado retorno a Moscou, No texto de Rafael, Lúcia é uma mulher sufocada na província que sonha com a volta para a capital, status que o Rio de Janeiro portava na década de 1950. No interior chegam ecos da cidade cosmopolita (a rivalidade entre Emilinha Borba e Marlene) e do país (uma anunciada vinda do presidente da República), que geram frisson, mas insuficiente para apaziguar as expectativas.
Como nas peças de Tchekhov, o público se depara com existências frustradas, projetos abortados, vidas em suspenso. Regina é uma atriz retirada há anos do ofício. Lúcia se vê impossibilitada de exercer a profissão de professora de francês. Engenheiro, Luiz, o marido, fica decepcionado com o resultado do seu trabalho num instante fundamental. Talvez a nuance em relação às peças do autor russo resida no fato de que em Cerca Viva os personagens partem para a ação, mesmo que lentamente. De certo modo, Lúcia e Luiz caminham em sentidos opostos, mas ambos rumo ao desconhecido – ela ao desejar a autonomia na cidade grande, ele ao avançar para um Brasil cada vez mais remoto.
Se Ibsen e Tchekhov são autores apressadamente classificados como realistas, a montagem dirigida por Cesar Augusto coloca o realismo em tensão. Esse estranhamento se dá na cenografia de Elsa Romero e Luiz Henrique Sá, que traz a estrutura externa de uma casa, a moldura destituída de preenchimento, um pouco como a estabilidade ilusória dos anos 1950. E o afastamento do realismo ocorre ainda no registro interpretativo do elenco, estabelecido na construção da peça, que faz os atores transitarem entre a narração e a vivência das personagens, oscilação praticada com considerável fluência. Camila Nhary projeta, com contundência, o crescente descontentamento de Lúcia, mas sem reduzi-la a uma nota única, desprovida de variação. Angela Rebello, com apreciável timming, conserva na voz o glamour de atriz de Regina, resquício de uma época que não volta mais. Gabriel Albuquerque desenha, com precisão, o marido vinculado a tradições. Sávio Moll concilia, na composição de Valcir, trabalhador da região, o acento de humor com o peso de uma mentalidade reacionária.
Por meio desse último personagem, o autor parece buscar um elo com os dias de hoje, apesar de não haver, nesse texto, articulações diretas com a atualidade e de o pensamento retrógrado não ser exclusividade de um período específico. Cerca Viva é uma peça que transcende – sem diminuir a importância – a sua localização histórica, suscitando associações com um passado mais distante e com o presente. São características do texto devidamente valorizadas na montagem.
Cerca Viva – Texto de Rafael Souza-Ribeiro. Direção de Cesar Augusto. Com Camila Nhary, Angela Rebello, Gabriel Albuquerque e Sávio Moll. Teatro Firjan/Sesi (Av. Graça Aranha, 1). Seg. e ter. às 19h. Ingressos: R$ 30,00, R$ 15,00 (meia-entrada).
Sem perder de vista o elo com os dias de hoje, Leci Brandão – Na Palma da Mão – espetáculo dirigido por Luiz Antonio Pilar, em cartaz no Mezanino do Espaço Sesc – transporta o público para um outro tempo, particularmente no que se refere ao Rio de Janeiro, cidade onde a cantora e compositora homenageada nasceu e cresceu. Os personagens surgem inseridos em ambiente que sugere um terreiro – de modo a destacar a conexão de Leci com a religiosidade afro-brasileira – ou um quintal – símbolo de um subúrbio amoroso e aprazível duramente abalado pela escalada da violência nas últimas décadas -, de acordo com a concepção cenográfica de Lorena Lima.
Apesar da evocação do passado, a montagem estimula associações com a atualidade, especialmente no que diz respeito ao engajamento de Leci com questões que permanecem em discussão, como justas reivindicações. Um exemplo é a defasagem de oportunidades para homens e mulheres, evidenciada na cena em que ela enfrenta preconceito ao ingressar na ala de compositores da Mangueira, escola do seu coração (conforme realçado nos figurinos de Rute Alves).
Musical de porte reduzido, Leci Brandão – Na Palma da Mão procura abraçar a extensão da trajetória da artista. Busca filiação na vertente biográfica, mas concilia a abordagem panorâmica com um recorte definido, centrado na relação entre Leci e a mulher que garantiu sua sustentação afetiva e apoio profissional – a mãe, Lecy. Esse vínculo atravessa o texto fluente de Leonardo Bruno (com adaptação dramatúrgica de Lorena Lima, Luiz Antonio Pilar e Luiza Loroza), que transita pelos principais estágios da jornada de Leci: a religiosidade, o breve contato com o pai que morreu precocemente, os passos iniciais na atividade artística que a fizeram romper com um lugar feminino tradicional, a consolidação da carreira, o período de ostracismo decorrente do desentendimento com a gravadora poderosa, o comprometimento com as pautas sociais e ideológicas e a adesão à militância política.
Luiz Antonio Pilar se vale do formato de musical intimista como estímulo para instigantes propostas cênicas. O chão repleto de folhas secas rende, pelo menos, um momento de impacto: aquele em que Leci, sem perspectivas de trabalho, sucumbe e é soterrada pelas folhas. O diretor, inclusive, poderia ter aproveitado um pouco mais as possibilidades das folhas para a criação de imagens não literais, o que reforçaria a teatralidade do espetáculo. Em todo caso, a montagem surpreende com a interação entre os atores, valorizando uma certa individualização corporal sem abrir mão da necessária sintonia entre eles (direção de movimento a cargo de Luiza Loroza). Tay O’Hanna, Verônica Bonfim e Sergio Kauffmann formam o afinado elenco: a primeira imprime credibilidade a uma Leci sanguínea e destemida, a segunda interpreta a mãe a partir de uma fisicalidade expansiva, notadamente emocional, e o terceiro acumula personagens, revelando segurança em cada composição e nas marcações de conjunto. Também cabe elogiar a integração dos músicos – Thainara Castro, Matheus Camará, Pedro Ivo e Rodrigo Pirikito -, sob a direção musical de Arifan Júnior.
Leci Brandão – Na Palma da Mão é um musical que, independentemente do efeito de uma eventual quebra da quarta parede para produzir uma proximidade ainda maior com o público, contagia de maneira genuína e demonstra habilidade na articulação entre passado e presente, abrangência e foco, objetividade e uma dose de abstração.
Leci Brandão – Na Palma da Mão – Texto de Leonardo Bruno. Direção de Luiz Antonio Pilar. Com Tay O’Hanna, Verônica Bonfim e Sergio Kauffmann. Mezanino do Sesc Copacabana (R. Domingos Ferreira, 160). De qui. A dom., às 20h30. Ingressos: R$ 30,00, R$ 15,00 (meia-entrada), R$ 7,50 (associados do Sesc).