Uma maratona impessoal
Lucio Mauro Filho em 5 X Comédia (Foto: André Gardenberg)
O projeto da primeira versão de 5 X Comédia, realizada em meados da década de 1990, remetia, devido à escalação de autores e atores, a iniciativas teatrais responsáveis pela revitalização do humor entre os anos 1970 e 1980, como o grupo Asdrúbal Trouxe o Trombone, que, conduzido por Hamilton Vaz Pereira, se notabilizou pelo registro interpretativo irreverente evidenciado, em especial, nos espetáculos construídos no sistema de criação coletiva (Trate-me Leão, Aquela Coisa Toda, A Farra da Terra), e o movimento do besteirol, calcado na encenação de textos críticos e ácidos, escritos, na maior parte das vezes, por duplas de atores.
Assim como o espetáculo anterior, o 5 X Comédia atual, em cartaz até o próximo domingo no Teatro Oi Casa Grande, é dirigido por Hamilton, agora em parceria com Monique Gardenberg. Novamente estruturado como sucessão de monólogos, o projeto não traz à tona, como o dos anos 1990, um fio histórico. A particularidade aqui parece residir na escalação de autores pouco óbvios, nem todos imediatamente sintonizados com um humor mais aberto, direto. Já o elenco é, em sua maioria, constituído por atores reconhecidos no campo da comédia, mesmo que não necessariamente restritos ao gênero. De qualquer modo, o resultado sinaliza desequilíbrio entre atores e textos. Em alguns casos, os primeiros superam os segundos, ainda que a fragilidade da dramaturgia influencie na atuação.
As discrepâncias ficam mais flagrantes nos três últimos esquetes. Em Arara Vermelha, Fabiula Nascimento surge em divertida composição física da arara revoltada com um poodle, disfarçando, até certo ponto, a inconsistência do texto de Jô Bilac. Em Milho aos Pombos, Thalita Carauta demonstra timing apreciável na incorporação de uma figurante deslocada que discute com o diretor. A atriz expande o alcance do material assinado por Pedro Kosovski (em colaboração com André Boucinhas). Em Regras de Convivência, Lucio Mauro Filho potencializa o constrangimento do homem surpreendido com uma noite de orgia. O mote rende menos que o esperado no texto de Gregório Duvivier.
Nos dois primeiros esquetes não há tanto contraste entre dramaturgias e atuações. Em Branca de Neve, uma animadora de festas infantis especializada na clássica heroína enfrenta a concorrência daquelas que vêm conquistando espaço através da imitação de personagens mais recentes. Julia Spadaccini satiriza o mundo idealizado dos contos de fadas em texto alongado e de expressão limitada no terreno do humor. Debora Lamm busca variedade de modulações. Não aborda o texto como bloco único. Mas as composições de voz soam artificiais. Em Nana, Nenê, Antonio Prata apresenta a via-crúcis de um homem que não mede esforços e meios para conseguir o brinquedo capaz de acalmar o filho recém-nascido. O personagem relata os vários incidentes, enquanto presta depoimento na delegacia. O autor e o ator revelam fluência – o primeiro na utilização do recurso do flashback e o segundo no ritmo bem dosado com que os acontecimentos são descortinados diante do público.
Mas o problema principal de 5 X Comédia não se encontra nos altos e baixos perceptíveis na reunião de esquetes, e sim numa impessoalidade que atravessa o espetáculo, da direção à concepção estética. A cenografia de Daniela Thomas e Camila Schmidt só se mostra mais determinante no último quadro, Regras de Convivência, por meio de fachada de prédio que divide a ação entre a varanda e a sala do apartamento. A iluminação de Maneco Quinderé emoldura a cena com diferentes cores intensas.
Talvez seja possível detectar elementos de conexão entre os esquetes – como o fato de boa parte dos personagens conversar ou se reportar a outros, invisíveis aos olhos dos espectadores –, mas esse 5 X Comédia carece de uma personalidade que eleve o trabalho acima do nível rotineiro.