Acima do entretenimento banal
Otávio Müller em A Vida Sexual da Mulher Feia (Foto: Lenise Pinheiro)
Adaptação de Julia Spadaccini para o livro de Claudia Tajes, A Vida Sexual da Mulher Feia traz à tona a jornada de uma personagem desprovida de atrativos físicos que descobre a importância da autoestima. Há no texto uma clara defesa de que a capacidade do indivíduo se valorizar – conquista adquirida com o amadurecimento – transforma o olhar lançado pelo mundo em relação a ele. Ao mesmo tempo em que revela certa ambição em demarcar uma distinção entre este projeto e as várias comédias descartáveis atuais, essa mensagem (oportuna, por sinal) realça, devido à sua evidência, as limitações do material dramatúrgico.
Em cartaz no Teatro dos Quatro, a montagem, dirigida pelo próprio Otávio Müller (único ator em cena), com supervisão de Amir Haddad, tende a deixar no público a sensação de conflito entre o desejo de tocar em cordas mais delicadas, a julgar pelo empenho em fazer da protagonista mais que um tipo circunstancial, e o perfil expansivo, de comédia rasgada, impresso desde o início, quando o ator recebe o público, diminuindo eventuais distâncias entre palco e plateia. Seja como for, Otávio Müller não envereda por composições apelativas. Desenha tanto a protagonista quanto os diversos personagens que atravessam seu percurso (estes mais caricaturais) com precisão, sem se apoiar em desgastadas muletas.
A produção segue a corrente de muitas montagens dos dias de hoje, que optam por soluções funcionais destituídas de maior mérito criativo. É o que se pode constatar na cenografia e nos figurinos de Adriana Schmidt e nos vídeos de Batman Zavareze e Nathalie Melot. Contudo, mesmo sem chegar a afirmar uma singularidade, A Vida Sexual da Mulher Feia voa acima do entretenimento banal.