Protagonismo (quase) dividido em musical sem turbulências

Otávio Muller, Elton Towersey e Jean Amorim em Tom Jobim Musical (Foto: Divulgação)
Seguindo a tradição dos musicais biográficos, essa encenação dirigida por João Fonseca, atualmente em cartaz no Teatro Casa Grande, apresenta ao público informações centrais da trajetória de Tom Jobim, o artista retratado. Nelson Motta e Pedro Brício, que assinam o texto, abordam, entre outros acontecimentos, a imensa repercussão da música Garota de Ipanema, a turnê nos Estados Unidos, a relevância da natureza na obra do compositor, a proximidade com um sempre perfeccionista João Gilberto e os relacionamentos conjugais. Mas os autores frisam, sobretudo, a parceria entre Tom Jobim e Vinicius de Moraes, a tal ponto que chega a soar estranho que o espetáculo não se chame Tom & Vinicius, apesar da existência prévia de um musical sobre ambos (Tom & Vinicius – O Musical, dirigido por Daniel Herz).
De fato, não é uma questão fácil de contornar. Afinal, o vínculo artístico entre Tom e Vinicius, iniciado em Orfeu da Conceição, foi enorme e duradouro. Em se tratando de um espetáculo intitulado Tom Jobim Musical, o desafio estaria em dimensionar Vinicius não como coprotagonista, mas como coadjuvante – sem, com isso, minimizar a importância dele para Tom e a música brasileira. Para hierarquizar os dois na montagem, a opção foi resumir aspectos da vida de Vinicius. O recurso, contudo, resulta algo artificial e ineficaz diante da projeção que esse personagem real acaba adquirindo na inspirada interpretação de Otávio Muller, que imprime uma cadência à fala sem uniformizá-la. O ator aposta num acento de humor, o que não implica na busca pelo riso imediato do público. Elton Towersey faz Tom Jobim numa linha mais neutra, linear, mas eficiente dentro da proposta do espetáculo.
Diretor revelado no teatro de grupo (Os Fodidos Privilegiados, que integrou antes como ator), João Fonseca acumulou experiência à frente de bem-sucedidas montagens de mercado, sejam comédias (Minha Mãe é uma Peça) ou musicais (Tim Maia – Vale Tudo, o Musical) e conduz Tom Jobim Musical em velocidade de cruzeiro, sem turbulências. Como muitos musicais biográficos, esse conta com a inclusão, na dramaturgia, de diversos e renomados artistas diretamente ligados ao percurso profissional do homenageado, casos de Elis Regina, Jair Rodrigues, Dolores Duran, Elza Soares, Billy Blanco, Cesar Camargo Mariano e o mencionado João Gilberto, que ganha composição mais realçada a cargo de Jean Amorim. Há poucas surpresas pelo caminho – ocasionalmente, no modo como uma música é inserida na estrutura dramatúrgica, valendo, inclusive, destacar os arranjos vocais e a orquestração de Thiago Gimenes, Ivan de Andrade e Tiago Saul.
A montagem também proporciona ao espectador a evocação de um Rio de Janeiro mais amoroso. Essa nostalgia saborosa é estimulada pelos figurinos de Theodoro Cochrane e, principalmente, pelo desenho sinuoso da madeira na cenografia de Natália Lana e Nello Marrese – que serve aos vários ambientes e situações de maneira sintética, ambicionando mais a atmosfera de décadas passadas do que a reconstituição realista. A iluminação de Caetano Vilela evidencia a escolha por tons distantes da aquarela suave de uma cidade que deixou saudade.
O protagonismo (quase) dividido entre Tom e Vinicius é o dado que gera certa dose de inquietação nesse espetáculo que flutua harmoniosamente, sem maiores pretensões de inovação, pelas conhecidas ondas do musical biográfico.
TOM JOBIM MUSICAL – Texto de Nelson Motta e Pedro Brício. Direção de João Fonseca. Com Elton Towersey, Otávio Muller, Analu Pimenta, Jean Amorim, Tiago Herz, Marcel Octavio, Estrela Blanco, Bela Quadros. Teatro Casa Grande (Av. Afrânio de Melo Franco, 290). Qui. e sex., às 20h, sáb. às 16h e 20h, dom., às 15h e 19h. Ingressos: de R$ 21,00 a R$ 320,00.