Diferentes proporções de um teatro político
Reconstituição de atmosfera de cabaré na montagem de Luz nas Trevas, a cargo da Cia. Ensaio Aberto (Foto: Renam Brandão)
A Cia. Ensaio Aberto ocupa um lugar específico em meio ao panorama teatral do Rio de Janeiro ao confirmar, a cada novo espetáculo, filiação a um perfil político-militante, frontalmente assumido por poucos coletivos brasileiros – entre eles, o Latão, sediado em São Paulo. Conduzida por Luiz Fernando Lobo, a Ensaio Aberto, há alguns anos, verticalizou a sua proposta ao migrar para o Armazém da Utopia, localizado em região da cidade antes degradada e hoje em (vagaroso) processo de reintegração, galpão de extensa proporção onde a companhia passou a mirar num público engajado, ocasionalmente distinto do tradicional de teatro.
Para a montagem de Luz nas Trevas, de Bertolt Brecht, atualmente em cartaz, o grupo reduziu a área de apresentação em configuração que lembra a do pequeno Teatro da Aliança Francesa de Botafogo, casa em que a Ensaio Aberto realizou suas montagens ao longo da década de 1990. Na encenação de Luiz Fernando Lobo, os espectadores são inseridos dentro da ação, acomodados em mesas em ambientação concebida como recriação da atmosfera de cabaré. O público é disposto no meio do espaço, entre os polos opostos do conflito, simbolizados pelo Sr. Paduk e a Sra. Hogge – com o primeiro sinalizando posicionamento moralista após ser expulso do bordel da segunda. A cena, que destaca disputa ideológica, acontece nas laterais, mais nas molduras que no centro.
Luiz Fernando Lobo instala clima de despretensão, evidenciando, porém, no decorrer da encenação, o desejo de presentificar o passado, no sentido de aproximar a discussão contida no texto de Brecht do noticiário recente. O diretor não força essa associação, que, em todo caso, se insinua de maneira clara diante da plateia. O elenco – formado por Leonardo Hinckel, Tuca Moraes, Gilberto Miranda, João Raphael Alves, Luiz Fernando Lobo, Luiza Moraes, Nady Oliveira, Natália Gadiolli e Tayara Maciel – demonstra segurança na inclusão do risco como elemento de trabalho (a julgar pelo modo como uma grande escada é manipulada) e entrosamento com o registro de atuação imperante na montagem, perceptível em presenças sólidas, mas condicionadas por um tom de voz uniformemente elevado. Essa opção parece ligada à produção de efeito didático que acaba soando um tanto monocórdico. Além disso, o volume amplificado contrasta, até certo ponto, com a ambientação. Hinckel, contudo, encontra maiores variações na voz, oscilações também estampadas em sua máscara facial.
Ainda que destoando da dimensão expandida de experiências anteriores e visando a uma interação mais direta com o público, Luz nas Trevas comprova a fidelidade da Cia. Ensaio Alberto aos seus princípios artísticos, voltados para a prática de uma cena épica, notadamente atravessada pelo aqui/agora.