Contundentes ecos dos anos de chumbo
Betina Viany e Guida Vianna dirigidas por Álamo Facó na leitura de Vivemos para Contar (Foto: Helio Melo)
A lembrança dos 50 anos do Golpe Militar norteou o evento Arte e Autoritarismo em Cena, que toma conta da arena do Espaço Sesc, em Copacabana, até o próximo dia 27 por meio de leituras de textos emblemáticos escritos e encenados durante a vigência da ditadura – ou que fazem referência ao período –, de depoimentos de mulheres vitimadas pela tortura e de roteiro cinematográfico, além da apresentação de show e espetáculo de dança. O convite para conduzir cada uma das atrações foi destinado a atores (Miwa Yanagizawa, Carolina Virgüez, Cesar Augusto, Álamo Facó), coreógrafa (Lia Rodrigues) e diretores (Luiz Fernando Lobo, Fabiano de Freitas).
Dois textos determinantes foram resgatados: Liberdade, Liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel, e Papa Highirte, de Oduvaldo Vianna Filho (Vianninha). O primeiro despontou em 1965 com o Grupo Opinião – nome oriundo do show Opinião, realizado um ano antes, com Zé Keti, João do Valle e Nara Leão (depois substituída por Maria Bethânia) – com Paulo Autran, Tereza Rachel, Nara Leão e Vianninha no elenco. A “temática” da liberdade vem à tona através de uma colagem de textos diversos entremeada por números musicais. A leitura de Liberdade, Liberdade foi feita por integrantes do grupo Código, companhia de Japeri com quem Miwa Yanagizawa tem trabalhado há certo tempo e contou com projeções que destacaram momentos contundentes da história brasileira, bem como uma entrevista com Flávio Rangel.
Já Papa Highirte ganhou o palco em encenação do Teatro dos 4 – sociedade formada por Sergio Britto, Mimina Roveda e Paulo Mamede – em 1979, assim que a peça de Vianninha foi liberada pela censura. Escrito em 1968, o texto permaneceu proibido durante alguns anos, apesar de ter vencido o concurso do Serviço Nacional de Teatro (SNT). A montagem prestou uma homenagem ao Teatro de Arena, a julgar pela importância de Vianninha e de Nelson Xavier, convidado para assumir a direção, dentro do grupo fundado por José Renato na primeira metade da década de 1950. A peça se passa numa república fictícia, denominada Alhambra, onde vive um ditador exilado, Papa Highirte, desejoso de retomar o poder, mas enfraquecido. A leitura foi realizada pela Cia. Ensaio Aberto, dirigida por Luiz Fernando Lobo, de perfil notadamente combativo.
Também na programação, Vivemos para Contar, reunião de depoimentos de Lucia Murat, Ines Etienne Romeu e Maria Amelia Telles, lidos, respectivamente, pelas atrizes Guida Vianna, Betina Viany e Beth Erthal. Cineasta, Murat vem abordando, ao longo dos anos, a sua trágica experiência nos porões da ditadura em filmes como o excelente documentário Que Bom te ver Viva (1989) e a recente ficção A Memória que me Contam (2012). Outra atração foi Minha Vida Depois, texto da argentina Lola Arias – que começou a ser apresentado, em 2009, em Buenos Aires – sobre jovens nascidos nas décadas de 1970 e 1980 que procuram reconstruir o passado dos pais. A condução ficou a cargo da colombiana Carolina Virgüez, que dirigiu alunos e ex-alunos da escola de teatro Martins Penna, onde dá aula. Durante a semana, o público verá ainda Apesar de Você, show com Marya Bravo, O Destino da Humanidade, roteiro inacabado de Glauber Rocha, e Aquilo de que somos feitos, criação de Lia Rodrigues concebida em 2000.